Os líderes do PS e do PSD estiveram frente a frente na quarta-feira naquele que foi o debate televisivo mais aguardado das eleições antecipadas de 18 de maio, em Portugal.
Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro estiveram, na noite desta quarta-feira, finalmente frente a frente, nas instalações da Universidade Nova SBE, em Carcavelos, para discutir o país, na sequência das legislativas de 18 de maio, depois de o debate ter sido adiado devido ao apagão que marcou o início desta semana.
Como era de se esperar, o debate começou com o tema do apagão que abalou o país na segunda-feira. O líder da AD começou por dizer que havia três prioridades: a técnica, a garantia dos serviços e, por fim, a comunicação. “Colocámos o ministro da Presidência a dar as primeiras comunicações na rádio, com base nas notícias que tínhamos”. Montenegro lembrou também que falou ao país logo às 15h00 e que, ao contrário de Espanha, não houve qualquer morte a lamentar.
Já o secretário-geral do PS começou por dar uma palavra de agradecimento aos portugueses: foram “corajosos”. Mas sublinhou que teria agido de forma diferente na gestão do apagão. “Se fosse primeiro-ministro, a primeira coisa que teria feito, era convocar o sistema de segurança interna”, porque ajudaria “a coordenar melhor a operações”. Pedro Nuno recordou que Portugal teve “os autarcas entregues à sua sorte” e disse que o Governo “perdeu a janela de oportunidade que permitia enviar uma mensagem aos portugueses enquanto havia comunicações ativas”.
Mas Montenegro quis responder. Disse que Pedro Nuno “não tem autoridade moral” para criticar o Governo, porque quanto esteve no seu lugar, “demonstrou exatamente do contrário”, dando o exemplo “da localização do aeroporto”. Mas o secretário-geral do PS recordou o tempo em que mediou a crise dos motoristas de matérias perigosas. “Estivemos à altura dessa crise”, sublinhou.
Feitas as contas com a eletricidade, o segundo grande tema foi sobre o crescimento da economia. O programa do PS, disse Pedro Nuno, “é mais prudente e cauteloso do que o da AD” – este é, na verdade, “um embuste que coloca taxas de crescimento que não são previstas por nenhuma instituição internacional para depois pôr despesa mais alta”. Luís Montenegro, respondeu acusando o adversário político de “duas faces”, “uma durante a campanha eleitoral e outra diferente para Bruxelas”. “Na campanha, apresenta taxas de crescimento que não são previstas por ninguém, mas depois em Bruxelas, apresenta taxas de crescimento inferiores”, explicou.
Montenegro chamou a atenção de Pedro Nuno Santos. “Temos mesmo de ser sérios. De uma ponta à outra”. E acrescentou que o secretário-geral do PS tinha acabado de “lançar uma confusão que, se não é mentira, é incompetência pura”. O líder da AD esclareceu que o seu programa “decorre do efeito que as nossas políticas vão provocando” e deu exemplos. “A nossa grande pedra de toque é o investimento público. Estamos a fazer a reforma da Saúde, da Habitação, da Mobilidade, a pensar no crescimento económico, e crescimento privado”, afirmou. Já o PS, disse ainda Montenegro, tem uma lógica de “redistribuição” que “não modifica nada na economia”.
Pedro Nuno Santos respondeu, garantindo que “não falta ambição ao programa do PS”, o que falta é “vergonha ao programa da AD”, porque “o que Luís Montenegro nos traz aqui é uma fantasia, um ato de fé”. O socialista defendeu, por exemplo, que a política de IRC do PS é “mais inteligente” e salientou que a AD “não é boa conselheira do crescimento económico”. O secretário-geral do PS relembrou também do corte de 10% no financiamento da FCT. “Não se transforma uma economia com menos estudantes no ensino superior e menos investimento na ciência”.
Montenegro repetiu novamente que Pedro Nuno Santos precisa de “ser sério” e que não houve nenhum corte no investimento da FCT. Aliás, afirmou que a Fundação para a Ciência e Economia teve a melhor taxa de execução de sempre. “O senhor não está preparado para argumentar”, atirou o líder da AD.
ando para o caderno da Saúde, Montenegro itiu que ainda há muito por fazer, mas que houve progressos. “É verdade que o SNS tem vários constrangimentos, vários problemas que vão demorar algum tempo a ser superados”, mas é, por exemplo, através da parcerias público-privadas que o caminho pode melhorar. “Porque é que os governos devem prender-se às amarras ideológicas? E que são muito próximas das ideias de Pedro Nuno Santos e dos seus aliados políticos”. Já sobre os médicos de família para todos até ao final deste ano – uma promessa que Montenegro tinha feito há um ano, o primeiro-ministro reconheceu que “já não era possível cumprir essa meta”. Será, assim sendo, “o mais rapidamente possível”, preferindo não avançar qualquer data.
Sobre a saúde, Pedro Nuno Santos deixou claro que “é a área de maior falhanço do Governo da AD, por responsabilidade direta e pessoal de Luís Montenegro”. O secretário-geral do PS acusou ainda o primeiro-ministro de criar “expetativas” nos portugueses, fazendo crer que “era fácil e rápido resolver os problemas na saúde”. Na questão dos médicos de família, Pedro Nuno Santos disse que era “óbvio” que promessa do Executivo não será cumprida. para o socialistas, é preciso reforçar as carreiras com uma “progressividade mais célere”. Já sobre a acusação de Montenegro acerca dos “dogmas ideológicos” das PPP, referiu que não existe nenhum preconceito ideológico, mas que prefere “dar mais autonomia de gestão às istrações dos nossos hospitais”.
Sobre o tema quente da noite, a Spinumviva, e sobre a nova lista de clientes revelada, pouco antes do debate, Pedro Nuno Santos afirmou que continuam a existir muitas respostas por dar. “Acrescentámos um coelho da cartola que Montenegro tirou algumas horas antes deste debate. É inaceitável, é gozar connosco, com os portugueses, é gozar com quem trabalha”.
“Não tornei pública nenhuma interação que tive com a Autoridade para a Transparência”, garantiu, por sua vez, Montenegro. “Para que fique mais uma vez claro: eu não acumulei as minhas funções de primeiro-ministro com mais nenhuma atividade”. O líder da AD reiterou que não recebeu “um único euro de nenhuma entidade privada” desde que é presidente do PSD. “Eu cumpri todas as minhas obrigações fiscais. Eu dei todas as informações que me foram pedidos”, assegurou.
Já visivelmente desconfortável, Montenegro partiu para as acusações. “Tudo o que foi dito por Pedro Nuno Santos corresponde a uma exploração de declarações gratuitas, é lamentável e deplorável que um líder político se preste a fazer, apenas com o intuito de tirar daí algum dividendo”. Mas Pedro Nuno Santos respondeu com sarcasmo: “Não se vitimize, porque a vida não o tratou mal, não é toda a gente que consegue sair da política e rapidamente consegue dois ajustes diretos com duas autarquias presididas por dois companheiros de partido e amigos”.
Luís Montenegro não cedeu e acusou novamente Pedro Nuno Santos: “O senhor fica espantado por eu ter recebido 190 mil euros de honorários de uma restruturação de uma empresa? Olhe, eu não só estava habilitado para fazer esse trabalho, como já demonstrei estar habilitado para reestruturar o país, que os senhores deixaram muito maltratado”.
Houve ainda tempo para falar de pensões. O secretário-geral do PS começou logo ao ataque e afirmou que a AD está “tão habituada a cortar pensões que cumprir a lei já é um feito para a AD”, mas que o PS sempre que pode, aumenta. “Sempre que podemos, o que fazemos é aumentos extraordinários para além do que está consagrado na lei”. O socialista relembrou que o governo da AD criou um grupo de trabalho para estudar as pensões, mas as posições da direita sobre privatizar a segurança social “são muito sólidas”.
Montenegro não gostou das acusações. “O senhor não tem limites à utilização deturpada de argumentos demagógicos”, reagiu o líder da AD, acrescentando que o Governo está “ a analisar as conclusões do estudo”. Sobre a Segurança Social, garantiu que não haverá qualquer alteração no sistema nesta legislatura. “Se algum dia eu tiver que a propor ao país, será na base de uma decisão eleitoral. Só o farei numa próxima legislatura, se for necessário”, assegurou.
Sobre o mesmo tema, Pedro Nuno Santos frisou que a posição do PS sobre o sistema público de pensões “nunca se alterou” e considera que ficou claro, esta noite, que Montenegro concorda com a privatização da Segurança Social. “Não tem é a coragem para fazer já nesta legislatura”, acrescentou.
Mudando a página para a Habitação, outro dos temas mais fraturantes, Montenegro refere que o seu governo conseguiu financiar a habitação com dinheiro do PRR e do Estado: foram “mais 2.800 milhões de euros para construir ou reabilitar mais 50 mil casas”. Relembrou também os apoios ao IMT Jovem e o arrendamento Porta 65. “Do lado da oferta privada, é preciso simplificar, é preciso ter incentivos fiscais, é preciso que do lado privado haja colaboração na oferta.”
Por sua vez, o secretário-geral socialista considera que as políticas que foram implementadas “produziram resultados contraproducentes”. Dá como exemplo o facto de as isenções aos jovens para compra de casa terem produzido a uma grande aceleração dos preços do imobiliário, porque não houve, do lado da oferta, uma cedência. “Os preços engoliram a totalidade do benefício”, disse, acrescentando também que o Executivo de Montenegro foi “incompetente” na gestão dos apoios ao arrendamento, como o Porta 65, os atrasos, agora, estão maiores, de “seis a sete meses, quando antes deste governo eram de dois meses”.
O socialista defendeu, aliás, que se deviam utilizar os dividendos da Caixa Geral de Depósitos para financiar a habitação pública. Mas sobre esta medida, Montenegro tem dúvidas. “Não são garantidos, isso faria fracassar a exequibilidade do programa nos dias em que não houvesse essa receita” e frisa que o país está, hoje, “a pagar o desinvestimento na habitação” pelos governos socialistas.
Pedro Nuno aproveitou para lembrar que o Governo da AD “não quer a devolução das propinas”, e acusou Montenegro de dar “com uma mão, e tirar com outra”. “Os jovens são uma prioridade para campanha eleitoral e enquanto basta”, acrescentou.
Sobre estabilidade governativa, Montenegro disse que continuará a governar “exatamente com os mesmos princípios”. “Apesar da instabilidade do partido socialista e do seu líder sobre o Orçamento do Estado, nós nunca desistimos do diálogo político”, afirmou.
Pegando na deixa da estabilidade, Pedro Nuno Santos disse: “Como é que Luís Montenegro pode garantir estabilidade política, prometer estabilidade política, quando assistimos àquilo que aconteceu nos últimos dois meses? Atirou o país para eleições”.
A fechar o debate, Montenegro guarda o seu último minuto final para se dirigir diretamente aos portugueses: “Não estou aqui para ataques pessoais, não estou aqui para maledicência, estou aqui para governar”. E com a mesma intenção, Pedro Nuno Santos destacou: “Vamos fazer uma defesa séria do sistema público de pensões e extinguirei o grupo de trabalho para a privatização da segurança social que o governo da AD nomeou”. E afirmou: “Pode confiar no PS, vote no PS”.