O Sistema Europeu Comum de Regresso tem como objetivo acelerar a deportação dos requerentes de asilo que não estão autorizados a permanecer na União Europeia. Num o inesperado, abre também a possibilidade de construir os controversos centros de detenção fora do bloco.
O regulamento revisto vem colmatar uma lacuna no Pacto em matéria de Migração e Asilo, que deverá ser aplicado a partir de julho de 2026, e visa resolver o facto de apenas cerca de 20% das ordens de deportação anuais serem executadas, de acordo com as instituições da UE.
Devem ser definidas listas de países de origem seguros e de países terceiros seguros para onde podem ser enviados os requerentes de asilo rejeitados. Nalguns desses países, podem ser construídos os chamados "centros de regresso" com o apoio financeiro dos Estados interessados da UE.
"A Comissão apresentou vários artigos que estabelecem a base legal para os Estados-membros construírem estes centros de deportação fora da União Europeia, mas a Comissão não vai estar envolvida na sua gestão", diz Jorge Liboreiro, que cobre a política de asilo e migração para a Euronews.
Esta externalização da migração tem sido apoiada pelos partidos de direita e foi considerada inaceitável pelo executivo da UE em 2018, quando tentou rever pela primeira vez o regulamento relativo ao regresso dos requerentes de asilo rejeitados.
"É a normalização de uma política que era considerada extrema", diz Jorge Liboreiro.
A maior representação de políticos nacionalistas e conservadores no Conselho Europeu e no Parlamento Europeu nos últimos dois anos levou os grupos poderosos, incluindo o Partido Popular Europeu (PPE), de centro-direita, a aceitar a ideia.
Javier Zarzalejos, presidente da Comissão de Justiça e Assuntos Internos do Parlamento Europeu, é um dos que vê valor nos eventuais acordos bilaterais para os centros.
"A União Europeia vai impor determinadas disposições a estes acordos, nomeadamente para garantir o respeito pelos direitos fundamentais, em particular dos mais vulneráveis nos centros", afirma o deputado espanhol do PPE.
No entanto, uma colega belga dos Verdes na comissão parlamentar, Saskia Bricmont, está menos convencida. "Não haverá controlo dos direitos fundamentais. Como é que a UE vai controlar a situação nos países terceiros quando vemos hoje, mesmo sem estes centros oficiais, violações dos direitos humanos por todo o lado?
Obrigações e sanções
A Comissão Europeia sublinhou que os centros de regresso não são o aspeto central da proposta legislativa, afirmando que a tónica é colocada nas medidas destinadas a obter uma maior cooperação por parte dos requerentes recusados a deixar o bloco voluntariamente.
O regulamento estabelece que o requerente de asilo rejeitado deve cooperar com as autoridades, nomeadamente fornecendo o seu bilhete de identidade e dados biométricos, e não deve fugir para outro Estado-Membro.
Se a pessoa não cooperar, as consequências podem incluir a redução ou recusa de benefícios e subsídios, a apreensão de documentos de identidade e proibições de entrada mais longas.
Serão provavelmente necessários longos meses de negociações para se chegar a um acordo entre os co-legisladores e o regulamento final poderá ser objeto de muitas alterações.
"Por um lado, compreendo as pessoas que migram para outros países porque estão a fugir de situações muito difíceis e delicadas. Por outro lado, precisamos de mais regulamentação, uma vez que, especialmente em Itália, existe atualmente demasiada confusão", diz um cidadão romano questionado pela Euronews sobre o assunto, sublinhando a dificuldade de encontrar um equilíbrio.
Os Estados-Membros da UE manifestaram a intenção de implementar uma mudança de paradigma na política em outubro ado, numa carta assinada por 12 países.
"A Itália, a Dinamarca e os Países Baixos têm liderado os debates políticos sobre a externalização, reunindo outros países numa espécie de coligação. Creio que estes três países poderão também fazer pressão para construir efetivamente os centros, agora que a regulamentação está em cima da mesa", diz Jorge Liboreiro.
Os tribunais nacionais e europeus podem levantar questões sobre a legalidade, como aconteceu com um centro de tratamento de pedidos de asilo construído pela Itália na Albânia, na sequência de um acordo bilateral. A infraestrutura foi paralisada por ações judiciais, mas o governo de Meloni pode agora considerar a possibilidade de transformar o centro num "centro de regresso".
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Jornalista: Isabel Marques da Silva
Produção de conteúdos: Pilar Montero López
Produção de vídeo: Zacharia Vigneron
Grafismo: Loredana Dumitru
Coordenação editorial: Ana Lázaro Bosch e Jeremy Fleming-Jones