A USAID tornou-se um alvo significativo de alegações falsas desde que Trump regressou à Casa Branca, e o escrutínio ao apoio dos EUA à Ucrânia intensificou-se.
Um vídeo falso está a ser amplamente partilhado nas redes sociais, alegando que os EUA pagaram 4 milhões de dólares (3,8 milhões de euros) à revista Time para nomear o presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, como "Pessoa do Ano" em 2022.
O vídeo é frequentemente publicado com legendas que afirmam que o anterior governo dos EUA, presidido por Joe Biden, utilizou o dinheiro dos contribuintes para "fazer uma lavagem cerebral" aos cidadãos e "subornar os meios de comunicação social".
Outros dizem que isto significa que não se pode confiar nos meios de comunicação ocidentais, porque supostamente se pode comprar a capa da Time "pelo preço certo".
O próprio vídeo diz que, desde que começou a operar, o novo Departamento de Eficiência Governamental (DOGE) do presidente Donald Trump, dirigido por Elon Musk, descobriu "enormes quantidades de dinheiro desperdiçadas pelo governo".
Para além das afirmações sobre Zelenskyy, o vídeo menciona que a USAID - a agência de ajuda internacional dos EUA - deu mais de 8 milhões de dólares ao Politico, financiou milhares de jornalistas e desviou dinheiro para o Partido Democrata.
O vídeo utiliza o logótipo do New York Post para sugerir que as afirmações provêm desse jornal, mas uma pesquisa no site deste meio de comunicação social norte-americano permite concluir que essa notícia não existe.
O Euro ou o New York Post, mas não obteve resposta até à data de publicação deste artigo de verificação de factos.
Podemos consultar ainda o siteUSAspending.gov, que não contém quaisquer pormenores sobre pagamentos à revista Time ou à Salesforce - empresa fundada pelo proprietário da Time, Marc Benioff.
A Time designou Zelenskyy e o Espírito da Ucrânia como a "Pessoa do Ano" em 2022, ano em que a Rússia lançou a sua invasão em larga escala sobre a Ucrânia. Na altura, a revista explicou as razões que motivaram a escolha.
USAID: um terreno fértil para a desinformação
A USAID tornou-se um alvo significativo de alegações falsas desde que Trump regressou à Casa Branca, e o escrutínio ao apoio dos EUA à Ucrânia intensificou-se.
As alegações sobre os 8 milhões de dólares alegadamente fornecidos ao Politico, por exemplo, estão incorretas, porque os registos mostram que a USAID apenas pagou 44.000 dólares em taxas de subscrição em 2023 e 2024, com pagamentos adicionais provenientes de outras entidades governamentais.
O Politico também referiu anteriormente, por via de uma declaração do seu CEO Goli Sheikholeslami e do editor-chefe John Harris, endereçada aos leitores, que não recebe qualquer subsídio governamental.
Outros meios de comunicação social também foram alvo de desinformação relacionada com a USAID: a BBC, por exemplo, teria recebido aproximadamente 3,2 milhões de dólares durante o ano financeiro de 2023-2024, segundo argumentado.
Mas esse dinheiro não se destinava à sua operação noticiosa - mas sim à BBC Media Action, uma instituição de caridade internacional que é "parte da família BBC", mas editorial e financeiramente separada da BBC News, explicou a instituição, em comunicado. Nesse ano, representou cerca de 8% do orçamento da BBC Media Action.
"Seguimos os padrões e valores editoriais da BBC no nosso apoio aos meios de comunicação de interesse público", lê-se no comunicado. "No entanto, todo o nosso financiamento vai para os nossos próprios projetos. Estes são completamente independentes do jornalismo da BBC News. Não temos qualquer influência sobre as decisões editoriais da BBC News. A BBC no Reino Unido é maioritariamente financiada por uma taxa de licença de televisão."
A BBC - não incluindo a BBC Media Action, que é uma entidade separada - também obtém receitas das suas filiais comerciais.
A Associated Press também se encontrava entre os meios de comunicação social que alegadamente recebiam financiamento da USAID. Embora a agência noticiosa tenha recebido 37,5 milhões de dólares de outras agências governamentais desde 2008, nenhuma parte desse montante proveio da USAID, de acordo com as estatísticas do governo federal.
A porta-voz da AP, Lauren Easton, referiu que "o governo dos EUA é cliente da AP há muito tempo - tanto nas istrações democratas como nas republicanas. Licencia o jornalismo apartidário da AP, tal como milhares de agências noticiosas e clientes em todo o mundo. É bastante comum que os governos tenham contratos com organizações noticiosas para os seus conteúdos".
Mas não são apenas os meios de comunicação social que estão a ser visados: a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, disse aos jornalistas, em fevereiro, que a USAID tinha gasto "1,5 milhões de dólares para promover a DEI [Diversidade, Equidade e Inclusão] nos locais de trabalho na Sérvia; 70 mil dólares para a produção de um musical DEI na Irlanda; 47 mil dólares para uma ópera transgénero na Colômbia; 32 mil dólares para uma banda desenhada transgénero no Peru".
As alegações espalharam-se rapidamente nas redes sociais ao longo da semana, mas apenas a subvenção destinada a uma organização sérvia chamada Grupa Izadji foi atribuída pela USAID. O seu objetivo a por "promover a diversidade, a equidade e a inclusão nos locais de trabalho e nas comunidades empresariais da Sérvia".
As restantes foram atribuídas pelo Gabinete do Subsecretário para a Diplomacia Pública e Assuntos Públicos do Departamento de Estado.
Em 2022, concedeu 70.884 dólares a uma empresa irlandesa para "um evento musical ao vivo destinado a promover os valores comuns dos EUA e da Irlanda em matéria de diversidade, equidade, inclusão e ibilidade".
Uma subvenção de 25.000 dólares foi concedida em 2021 a uma universidade na Colômbia "para sensibilizar e aumentar a representação dos indivíduos transexuais" através da produção de uma ópera, com um montante adicional de 22.020 dólares proveniente de financiamento não federal.
Outros 32.000 dólares atribuídos em 2022 a uma organização peruana financiaram "uma banda desenhada feita à medida, com um herói LGBTQ+ para abordar questões sociais e de saúde mental".
Especialistas explicaram à AP que faz sentido que estes programas sejam financiados pelo gabinete do subsecretário, porque é suposto refletirem os valores dos EUA, como a diversidade e a democracia, e a amizade entre países.
Os recentes acontecimentos mundiais colocam em evidência a quantidade de dinheiro que a Europa e os EUA enviam para o estrangeiro, pelo que é fundamental que o público seja corretamente informado.