{ "@context": "https://schema.org/", "@graph": [ { "@type": "NewsArticle", "mainEntityOfPage": { "@type": "Webpage", "url": "/business/2023/10/23/ue-como-reformar-pec-para-baixar-divida-e-defice-elevados" }, "headline": "UE: Como reformar PEC para baixar d\u00edvida e d\u00e9fice elevados?", "description": "A Uni\u00e3o Europeia (UE) est\u00e1 a reformar as suas regras fiscais, ao n\u00edvel do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), que pretende fechar at\u00e9 ao final do ano. Esta an\u00e1lise explica porque \u00e9 t\u00e3o importante para baixar os n\u00edveis elevados de d\u00edvida e de d\u00e9fice dos pa\u00edses.", "articleBody": "As regras do PEC remontam ao final dos anos 90, quando os Estados-membros que pretendiam adotar o euro eram obrigados a manter os d\u00e9fices or\u00e7amentais abaixo dos 3% do produto interno bruto (PIB) e a d\u00edvida p\u00fablica abaixo dos 60% em rela\u00e7\u00e3o ao PIB. 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Quatro pontos de reforma A Comiss\u00e3o Europeia prop\u00f4s, em abril, uma revis\u00e3o para tornar as regras or\u00e7amentais mais atualizadas e \u0022resistentes\u0022 a choques no futuro.\u00a0 A proposta mant\u00e9m inalterados os objetivos de 3% e 60%, que alguns economistas consideram obsoletos e arbitr\u00e1rios, mas introduz altera\u00e7\u00f5es importantes na forma como os dois valores devem ser atingidos, na pr\u00e1tica. Cada Estado-membro ter\u00e1 de conceber um plano or\u00e7amental, a m\u00e9dio prazo, para reduzir os seus n\u00edveis de d\u00e9fice a um ritmo cred\u00edvel e colocar a d\u00edvida p\u00fablica numa \u0022trajet\u00f3ria descendente plaus\u00edvel\u0022, que ter\u00e1 de ser negociado com a Comiss\u00e3o Europeia e aprovado pelo Conselho da UE. 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Salvaguardas para a redu\u00e7\u00e3o da d\u00edvida Todos na UE concordam que os elevados n\u00edveis de d\u00edvida p\u00fablica s\u00e3o prejudiciais e devem ser reduzidos. O que ningu\u00e9m est\u00e1 de acordo \u00e9 quanto ao ritmo dessa redu\u00e7\u00e3o.\u00a0 Pa\u00edses como a Fran\u00e7a, a It\u00e1lia, a Espanha, Portugal e a Gr\u00e9cia, que t\u00eam r\u00e1cios de d\u00edvida em rela\u00e7\u00e3o ao PIB que excedem o limiar de 100%, est\u00e3o interessados em manter a maior flexibilidade poss\u00edvel. Argumentam que os planos a m\u00e9dio prazo teriam em conta as suas caracter\u00edsticas nacionais e permitir-lhes-iam tra\u00e7ar o seu pr\u00f3prio caminho em dire\u00e7\u00e3o a finan\u00e7as s\u00e3s. Mas um grupo mais alargado, que inclui a Alemanha, os Pa\u00edses Baixos, a \u00c1ustria, a Dinamarca, a Litu\u00e2nia, a Let\u00f3nia e a Est\u00f3nia, receia que esta margem de manobra possa ser utilizada de forma abusiva e conduzir a um lento decl\u00edneo da d\u00edvida, o que enfraqueceria a credibilidade das regras or\u00e7amentais face aos mercados de capitais. No in\u00edcio de abril, a Alemanha publicou um documento informal defendendo uma \u0022salvaguarda comum\u0022, que obrigaria os Estados-membros com r\u00e1cios de d\u00edvida em rela\u00e7\u00e3o ao PIB superiores a 60% a reduzir os n\u00edveis de d\u00edvida em 0,5% ou 1% por ano, dependendo do seu ponto de partida. \u0022Deve tamb\u00e9m ser assegurada uma redu\u00e7\u00e3o efetiva dos r\u00e1cios da d\u00edvida numa base anual\u0022, diz o documento. Dias depois, a Comiss\u00e3o Europeia fez uma concess\u00e3o, propondo salvaguardas, incluindo a obriga\u00e7\u00e3o de reduzir o d\u00e9fice em 0,5% do PIB por ano, at\u00e9 que este des\u00e7a abaixo dos 3%. O executivo comunit\u00e1rio, no entanto, n\u00e3o introduziu uma regra uniforme para reduzir os n\u00edveis de d\u00edvida numa determinada percentagem, todos os anos - precisamente o que a Alemanha tinha exigido.\u00a0 Em vez disso, introduziu um requisito de reda\u00e7\u00e3o vaga que diz que os r\u00e1cios da d\u00edvida em rela\u00e7\u00e3o ao PIB devem ser mais baixos no final dos planos a m\u00e9dio prazo do que no in\u00edcio. Esta medida n\u00e3o satisfez Christian Lindner, ministro federal das Finan\u00e7as da Alemanha, que, desde ent\u00e3o, tem defendido a ado\u00e7\u00e3o de salvaguardas num\u00e9ricas que garantam a \u0022igualdade de tratamento\u0022 entre os pa\u00edses e assegurem resultados tang\u00edveis.\u00a0 Mas o seu hom\u00f3logo franc\u00eas, Bruno Le Maire, rejeitou esta ideia, advertindo que as normas autom\u00e1ticas seriam um \u0022erro pol\u00edtico\u0022 e prejudicariam o crescimento econ\u00f3mico e a produtividade. S\u00f3 um compromisso franco-alem\u00e3o poder\u00e1 quebrar o ime. Reformas e investimentos As ambi\u00e7\u00f5es a longo prazo da UE t\u00eam um pre\u00e7o elevado. S\u00f3 para concretizar o Pacto Ecol\u00f3gico Europeu, o bloco de 27 pa\u00edses\u00a0precisar\u00e1 de 620 mil milh\u00f5es de euros de investimentos adicionais, todos os anos at\u00e9 2030.\u00a0 Para a transi\u00e7\u00e3o digital, ser\u00e3o necess\u00e1rios 125 mil milh\u00f5es de euros por ano, enquanto as despesas com a defesa poder\u00e3o exigir 75 mil milh\u00f5es de euros, at\u00e9 2025. Prev\u00ea-se que a maior parte do dinheiro venha do setor privado. Ainda assim, os n\u00fameros\u00a0 fazem com que os governos se perguntem como conseguir\u00e3o obter montantes t\u00e3o elevados. \u00c9 por isso que a quest\u00e3o das reformas e, em especial, dos investimentos est\u00e1 no centro da revis\u00e3o das regras or\u00e7amentais. A Comiss\u00e3o Europeia afirma que a sua proposta deixa espa\u00e7o suficiente para que os Estados-membros possam, por um lado, injetar fundos em grandes prioridades tais como as energias limpas e os semicondutores mais avan\u00e7ados e, por outro, manter as despesas p\u00fablicas a n\u00edveis \u0022prudentes\u0022. Mas algumas capitais n\u00e3o est\u00e3o convencidas e est\u00e3o a fazer press\u00e3o para introduzir a chamada \u0022regra de ouro\u0022, que retiraria certos investimentos-chave do c\u00e1lculo dos r\u00e1cios do d\u00e9fice e da d\u00edvida, poupando-os \u00e0 vigil\u00e2ncia or\u00e7amental. A It\u00e1lia, o principal proponente dessa regra, sugeriu fundos de recupera\u00e7\u00e3o e projetos militares como poss\u00edveis \u00e1reas que poderiam ser abrangidas. \u0022Os investimentos e as despesas ligadas \u00e0s prioridades europeias, incluindo a defesa, s\u00e3o objetivos pol\u00edticos estrat\u00e9gicos que as nossas regras or\u00e7amentais n\u00e3o podem ignorar\u0022, disse Giancarlo Giorgetti, ministro italiano da Economia, em outubro. A coliga\u00e7\u00e3o liderada pela Alemanha op\u00f5e-se frontalmente a qualquer tipo de \u0022regra de ouro\u0022 porque poderia abrir o precedente para outras isen\u00e7\u00f5es no futuro, abriria \u0022buracos\u0022 no quadro fiscal e prejudicaria a sua efic\u00e1cia. Aplica\u00e7\u00e3o da lei As regras or\u00e7amentais atuais t\u00eam um mecanismo de corre\u00e7\u00e3o conhecido como Procedimento por D\u00e9fice Excessivo (PDE), que \u00e9 acionado quando o r\u00e1cio d\u00e9fice/PIB de um pa\u00eds excede o limite de 3%. Apesar do seu nome, tamb\u00e9m pode ser ativado quando o r\u00e1cio d\u00edvida/PIB ultraa o limite m\u00e1ximo de 60% e n\u00e3o diminui a um \u0022ritmo satisfat\u00f3rio\u0022. Se um pa\u00eds, depois de ter sido colocado sob o PDE, n\u00e3o tomar medidas suficientes para corrigir as suas irregularidades financeiras, pode ser multado at\u00e9 0,5% do seu PIB. No entanto, a amea\u00e7a de pagamento n\u00e3o se traduziu numa melhor aplica\u00e7\u00e3o da lei. O quadro fiscal da UE tem sido criticado pela sua aplica\u00e7\u00e3o desigual e branda, uma vez que os n\u00edveis de d\u00edvida ultraaram a marca dos 100%, mas nunca foram aplicadas multas. Bruxelas quer endurecer a posi\u00e7\u00e3o e prop\u00f4s altera\u00e7\u00f5es para acelerar o PDE, no caso de um pa\u00eds se desviar dos compromissos assumidos no seu plano a m\u00e9dio prazo. Para os pa\u00edses altamente endividados que se afastem da tend\u00eancia positiva, o PDE ser\u00e1 acionado por defeito.\u00a0 A reforma prev\u00ea ainda multas menores, com maior probabilidade de serem aplicadas, e medidas de explica\u00e7\u00e3o, tais como a apresenta\u00e7\u00e3o dos ministros perante o Parlamento Europeu. As conversa\u00e7\u00f5es em curso destinam-se a aperfei\u00e7oar estas disposi\u00e7\u00f5es, com os pa\u00edses de \u0022esp\u00edrito frugal\u0022 a insistirem em garantias mais fortes para assegurar melhor implementa\u00e7\u00e3o das regras. Equil\u00edbrio institucional O \u00faltimo ponto de fric\u00e7\u00e3o decorre da conhecida luta de poderes entre a Comiss\u00e3o e o Conselho europeus. De acordo com a proposta atual, a Comiss\u00e3o Europeia emitiria orienta\u00e7\u00f5es econ\u00f3micas para cada pa\u00eds e negociaria o plano a m\u00e9dio prazo, que deveria tra\u00e7ar o caminho para uma redu\u00e7\u00e3o progressiva dos n\u00edveis do d\u00e9fice e da d\u00edvida, associada a reformas e investimentos. \u00c0 semelhan\u00e7a do m\u00e9todo utilizado para os fundos de recupera\u00e7\u00e3o da Covid-19 (PRR), os planos or\u00e7amentais seriam ent\u00e3o aprovados pelo Conselho da UE e a sua execu\u00e7\u00e3o seria efectuada por cada governo, sob a supervis\u00e3o da Comiss\u00e3o. O executivo avaliar\u00e1 se os compromissos est\u00e3o a ser cumpridos e, se necess\u00e1rio, propor\u00e1 medidas correctivas. Este modo de funcionamento suscitou receios de que o executivo concentrasse demasiado poder em todo o processo e que, consequentemente, os Estados-membros pudessem ser postos de lado. As discuss\u00f5es centram-se, agora, na forma de ajustar esta distribui\u00e7\u00e3o de poderes. \u0022\u00c9 bom ter outro par de olhos\u0022, disse um diplomata \u00e0 euronews, que sugeriu o envolvimento do Conselho Or\u00e7amental Europeu, um \u00f3rg\u00e3o consultivo independente, no processo. O equil\u00edbrio institucional e a aplica\u00e7\u00e3o da legisla\u00e7\u00e3o s\u00e3o considerados os mais avan\u00e7ados dos quatro pilares, enquanto as salvaguardas e os investimentos continuam a ser desafios formid\u00e1veis. 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UE: Como reformar PEC para baixar dívida e défice elevados?

A ministra espanhola da Economia, Nadia Calviño, na foto ao centro, fala com os seus homólogos francês e alemão: Bruno Le Maire (à esquerda) e Christian Lindner (à direita).
A ministra espanhola da Economia, Nadia Calviño, na foto ao centro, fala com os seus homólogos francês e alemão: Bruno Le Maire (à esquerda) e Christian Lindner (à direita). Direitos de autor European Union, 2023.
Direitos de autor European Union, 2023.
De Jorge LiboreiroIsabel Marques da Silva (Trad.)
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A União Europeia (UE) está a reformar as suas regras fiscais, ao nível do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), que pretende fechar até ao final do ano. Esta análise explica porque é tão importante para baixar os níveis elevados de dívida e de défice dos países.

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As regras do PEC remontam ao final dos anos 90, quando os Estados-membros que pretendiam adotar o euro eram obrigados a manter os défices orçamentais abaixo dos 3% do produto interno bruto (PIB) e a dívida pública abaixo dos 60% em relação ao PIB. O PEC aplica-se, atualmente, a todos os países da UE, numa tentativa de garantir finanças estáveis.

Desde então, o PEC foi modificado para fazer face ao colapso financeiro de 2007 e à consequente crise da dívida soberana, que levou alguns países a adotar medidas de austeridade para controlar o aumento das despesas.

Em 2023, a necessidade de uma nova reforma torna-se evidente: em apenas três anos, o bloco atravessou a pandemia de Covid-19, a guerra da Rússia contra a Ucrânia, uma crise energética e uma inflação recorde. 

Se a isto juntarmos o agravamento dos efeitos das alterações climáticas e a corrida mundial às tecnologias de ponta, chega-se à conclusão que um cenário económico profundamente transformado implica rever as regras.

Quatro pontos de reforma

A Comissão Europeia propôs, em abril, uma revisão para tornar as regras orçamentais mais atualizadas e "resistentes" a choques no futuro. 

A proposta mantém inalterados os objetivos de 3% e 60%, que alguns economistas consideram obsoletos e arbitrários, mas introduz alterações importantes na forma como os dois valores devem ser atingidos, na prática.

Cada Estado-membro terá de conceber um plano orçamental, a médio prazo, para reduzir os seus níveis de défice a um ritmo credível e colocar a dívida pública numa "trajetória descendente plausível", que terá de ser negociado com a Comissão Europeia e aprovado pelo Conselho da UE.

Os ajustamentos orçamentais necessários para atingir - ou pelo menos aproximar-se - dos objetivos de 3% e 60% deveriam ser realizados ao longo de quatro anos, de acordo com os ciclos eleitorais, e poderiam ser alargados para sete anos em troca de novas reformas e investimentos.

Embora a combinação de sustentabilidade fiscal e apropriação nacional tenha sido bem recebida por todos, os ministros da Economia e das Finanças estão, há meses, a negociardisposições de carácter extremamente técnico.

Na esperança de colmatar as lacunas, a Espanha, atual detentora da presidência rotativa do Conselho Europeu, dividiu as conversações em quatro "blocos de construção", que se revelaram quatro pontos de fricção. A pressão é grande, uma vez que as regras fiscais estão suspensas e devem voltar a ser aplicadas a 1 de janeiro de 2024.

Salvaguardas para a redução da dívida

Todos na UE concordam que os elevados níveis de dívida pública são prejudiciais e devem ser reduzidos. O que ninguém está de acordo é quanto ao ritmo dessa redução. 

Países como a França, a Itália, a Espanha, Portugal e a Grécia, que têm rácios de dívida em relação ao PIB que excedem o limiar de 100%, estão interessados em manter a maior flexibilidade possível. Argumentam que os planos a médio prazo teriam em conta as suas características nacionais e permitir-lhes-iam traçar o seu próprio caminho em direção a finanças sãs.

Mas um grupo mais alargado, que inclui a Alemanha, os Países Baixos, a Áustria, a Dinamarca, a Lituânia, a Letónia e a Estónia, receia que esta margem de manobra possa ser utilizada de forma abusiva e conduzir a um lento declíneo da dívida, o que enfraqueceria a credibilidade das regras orçamentais face aos mercados de capitais.

No início de abril, a Alemanha publicou um documento informal defendendo uma "salvaguarda comum", que obrigaria os Estados-membros com rácios de dívida em relação ao PIB superiores a 60% a reduzir os níveis de dívida em 0,5% ou 1% por ano, dependendo do seu ponto de partida.

"Deve também ser assegurada uma redução efetiva dos rácios da dívida numa base anual", diz o documento.

Dias depois, a Comissão Europeia fez uma concessão, propondo salvaguardas, incluindo a obrigação de reduzir o défice em 0,5% do PIB por ano, até que este desça abaixo dos 3%.

O executivo comunitário, no entanto, não introduziu uma regra uniforme para reduzir os níveis de dívida numa determinada percentagem, todos os anos - precisamente o que a Alemanha tinha exigido. 

Em vez disso, introduziu um requisito de redação vaga que diz que os rácios da dívida em relação ao PIB devem ser mais baixos no final dos planos a médio prazo do que no início.

Esta medida não satisfez Christian Lindner, ministro federal das Finanças da Alemanha, que, desde então, tem defendido a adoção de salvaguardas numéricas que garantam a "igualdade de tratamento" entre os países e assegurem resultados tangíveis. 

Mas o seu homólogo francês, Bruno Le Maire, rejeitou esta ideia, advertindo que as normas automáticas seriam um "erro político" e prejudicariam o crescimento económico e a produtividade.

Só um compromisso franco-alemão poderá quebrar o ime.

Reformas e investimentos

As ambições a longo prazo da UE têm um preço elevado. Só para concretizar o Pacto Ecológico Europeu, o bloco de 27 países precisará de 620 mil milhões de euros de investimentos adicionais, todos os anos até 2030. 

Para a transição digital, serão necessários 125 mil milhões de euros por ano, enquanto as despesas com a defesa poderão exigir 75 mil milhões de euros, até 2025.

Prevê-se que a maior parte do dinheiro venha do setor privado. Ainda assim, os números  fazem com que os governos se perguntem como conseguirão obter montantes tão elevados.

É por isso que a questão das reformas e, em especial, dos investimentos está no centro da revisão das regras orçamentais. A Comissão Europeia afirma que a sua proposta deixa espaço suficiente para que os Estados-membros possam, por um lado, injetar fundos em grandes prioridades tais como as energias limpas e os semicondutores mais avançados e, por outro, manter as despesas públicas a níveis "prudentes".

Mas algumas capitais não estão convencidas e estão a fazer pressão para introduzir a chamada "regra de ouro", que retiraria certos investimentos-chave do cálculo dos rácios do défice e da dívida, poupando-os à vigilância orçamental.

A Itália, o principal proponente dessa regra, sugeriu fundos de recuperação e projetos militares como possíveis áreas que poderiam ser abrangidas.

"Os investimentos e as despesas ligadas às prioridades europeias, incluindo a defesa, são objetivos políticos estratégicos que as nossas regras orçamentais não podem ignorar", disse Giancarlo Giorgetti, ministro italiano da Economia, em outubro.

A coligação liderada pela Alemanha opõe-se frontalmente a qualquer tipo de "regra de ouro" porque poderia abrir o precedente para outras isenções no futuro, abriria "buracos" no quadro fiscal e prejudicaria a sua eficácia.

Aplicação da lei

As regras orçamentais atuais têm um mecanismo de correção conhecido como Procedimento por Défice Excessivo (PDE), que é acionado quando o rácio défice/PIB de um país excede o limite de 3%. Apesar do seu nome, também pode ser ativado quando o rácio dívida/PIB ultraa o limite máximo de 60% e não diminui a um "ritmo satisfatório".

Se um país, depois de ter sido colocado sob o PDE, não tomar medidas suficientes para corrigir as suas irregularidades financeiras, pode ser multado até 0,5% do seu PIB.

No entanto, a ameaça de pagamento não se traduziu numa melhor aplicação da lei. O quadro fiscal da UE tem sido criticado pela sua aplicação desigual e branda, uma vez que os níveis de dívida ultraaram a marca dos 100%, mas nunca foram aplicadas multas.

Bruxelas quer endurecer a posição e propôs alterações para acelerar o PDE, no caso de um país se desviar dos compromissos assumidos no seu plano a médio prazo. Para os países altamente endividados que se afastem da tendência positiva, o PDE será acionado por defeito. 

A reforma prevê ainda multas menores, com maior probabilidade de serem aplicadas, e medidas de explicação, tais como a apresentação dos ministros perante o Parlamento Europeu.

As conversações em curso destinam-se a aperfeiçoar estas disposições, com os países de "espírito frugal" a insistirem em garantias mais fortes para assegurar melhor implementação das regras.

Equilíbrio institucional

O último ponto de fricção decorre da conhecida luta de poderes entre a Comissão e o Conselho europeus.

De acordo com a proposta atual, a Comissão Europeia emitiria orientações económicas para cada país e negociaria o plano a médio prazo, que deveria traçar o caminho para uma redução progressiva dos níveis do défice e da dívida, associada a reformas e investimentos.

À semelhança do método utilizado para os fundos de recuperação da Covid-19 (PRR), os planos orçamentais seriam então aprovados pelo Conselho da UE e a sua execução seria efectuada por cada governo, sob a supervisão da Comissão. O executivo avaliará se os compromissos estão a ser cumpridos e, se necessário, proporá medidas correctivas.

Este modo de funcionamento suscitou receios de que o executivo concentrasse demasiado poder em todo o processo e que, consequentemente, os Estados-membros pudessem ser postos de lado. As discussões centram-se, agora, na forma de ajustar esta distribuição de poderes.

"É bom ter outro par de olhos", disse um diplomata à euronews, que sugeriu o envolvimento do Conselho Orçamental Europeu, um órgão consultivo independente, no processo.

O equilíbrio institucional e a aplicação da legislação são considerados os mais avançados dos quatro pilares, enquanto as salvaguardas e os investimentos continuam a ser desafios formidáveis.

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