{ "@context": "https://schema.org/", "@graph": [ { "@type": "NewsArticle", "mainEntityOfPage": { "@type": "Webpage", "url": "/my-europe/2025/05/23/ha-uma-tendencia-para-fazer-de-putin-um-verdadeiro-super-homem-diz-diretor-das-secretas-da" }, "headline": "\u0022H\u00e1 uma tend\u00eancia para fazer de Putin um verdadeiro super-homem\u0022, diz diretor das \u201csecretas\u201d da UE", "description": "O respons\u00e1vel pelas \u201csecretas\u201d europeias acredita que a invas\u00e3o russa da Ucr\u00e2nia mudou a forma como pensamos e usamos os servi\u00e7os de informa\u00e7\u00f5es e defende que a UE pode fazer mais nessa \u00e1rea \u2013 e que os Estados-membros est\u00e3o dispon\u00edveis para isso.", "articleBody": "Daniel Marki\u0107 foi nomeado h\u00e1 poucos meses diretor do Centro de Situa\u00e7\u00e3o e Intelig\u00eancia da Uni\u00e3o Europeia (EU INTCEN), o mais pr\u00f3ximo que existe de um servi\u00e7o de informa\u00e7\u00f5es europeus, ap\u00f3s nove anos \u00e0 frente das secretas croatas. Na depend\u00eancia da Alta Representante para a Pol\u00edtica Externa, Kaja Kallas, o INTCEN \u2013 que foi anteriormente dirigido pelo portugu\u00eas Jos\u00e9 Casimiro Morgado \u2013 tem a miss\u00e3o de monitorizar o que acontece dentro e fora da UE e fornecer an\u00e1lises e alertas \u00e0s institui\u00e7\u00f5es, decisores e Estados-membros na \u00e1rea da seguran\u00e7a, defesa e contra terrorismo. De agem por Lisboa para participar numa confer\u00eancia inserida nas comemora\u00e7\u00f5es dos 30 anos do Servi\u00e7o de Informa\u00e7\u00f5es Estrat\u00e9gicas e de Defesa (SIED), deu uma entrevista exclusiva ao Nascer do SOL e \u00e0 Euronews na qual identifica as principais amea\u00e7as \u00e0 seguran\u00e7a da Uni\u00e3o Europeia (UE), a coopera\u00e7\u00e3o entre servi\u00e7os de informa\u00e7\u00f5es e explica o que considera ser o futuro do setor.Qual o papel do INTCEN na UE?Nos \u00faltimos 20 anos o INTCEN tem sido uma esp\u00e9cie de centro de fus\u00e3o de informa\u00e7\u00f5es da Uni\u00e3o Europeia. Costumava fazer parte do Conselho, mas com as diferentes reformas das institui\u00e7\u00f5es agora faz parte do Servi\u00e7o Europeu de A\u00e7\u00e3o Externa (SEAE). As pessoas que trabalham no INTCEN prov\u00eam na maioria dos servi\u00e7os de seguran\u00e7a e de informa\u00e7\u00f5es dos Estados-membros e trabalhamos de forma muito pr\u00f3xima com as informa\u00e7\u00f5es militares [EUMS Intelligence Directorate], sob um chap\u00e9u informal chamado SIAC, Single Intelligence and Analysis Capacity \u2013 e funciona muito bem. Mas agora achamos que o que est\u00e1 a ser feito em termos de informa\u00e7\u00f5es pode n\u00e3o ser suficiente.Porqu\u00ea?Temos de fazer mais. A UE compreendeu h\u00e1 uns anos que n\u00e3o \u00e9 apenas um ator pol\u00edtico e econ\u00f3mico global, mas que \u00e9 potencialmente um ator em termos de seguran\u00e7a. Em 2020 foi feita a primeira an\u00e1lise de amea\u00e7as, nomeadamente pela SIAC. Ela foi revista em 2022 e fizemos uma terceira vers\u00e3o h\u00e1 uns meses. Isso prova que a UE estava a tentar pensar sobre as amea\u00e7as para encontrar solu\u00e7\u00f5es para as enfrentar.Est\u00e1 a falar de amea\u00e7as civis ou militares? Porque quando pensamos em amea\u00e7as militares pensamos tamb\u00e9m na NATO.Globalmente, sobre todas as amea\u00e7as. E depois existe o\u00a0 famoso documento estrat\u00e9gico, a B\u00fassola Estrat\u00e9gica [documento aprovado em 22 de mar\u00e7o de 2022 que fornece orienta\u00e7\u00f5es e uma vis\u00e3o comum para refor\u00e7ar a pol\u00edtica de seguran\u00e7a e defesa da UE at\u00e9 2030], que descreve, mais uma vez, a capacidade da UE. E_\u00e9 a\u00ed que encontramos uma pequena parte do documento que refere o SIAC como sendo o \u00fanico ponto de entrada de informa\u00e7\u00f5es estrat\u00e9gicas na UE. Temos que nos lembrar que em termos de informa\u00e7\u00f5es, para os Estados-membros h\u00e1 um artigo importante no Tratado da Uni\u00e3o Europeia, o 4.2, que diz que a seguran\u00e7a nacional \u00e9 uma compet\u00eancia dos Estados. Sabendo tudo isso, temos que encontrar maneiras de dar mais. A UE precisa de mais. E os Estados-membros est\u00e3o dispon\u00edveis para dar mais.Est\u00e3o?Sim, est\u00e3o.\u00c9 que a partilha de informa\u00e7\u00f5es foi sempre um tema sens\u00edvel?\u00c9 sens\u00edvel. Mas existe e funciona muito bem. Digo isto n\u00e3o apenas como diretor do INTCEN mas trabalhei os \u00faltimos nove anos como diretor de um servi\u00e7o nacional de informa\u00e7\u00f5es e seguran\u00e7a. E funciona. Mas quando h\u00e1 uma sensa\u00e7\u00e3o de que os servi\u00e7os n\u00e3o fazem o suficiente com frequ\u00eancia \u00e9 porque eles n\u00e3o comunicam o suficiente. Temos de dar mais visibilidade \u00e0s informa\u00e7\u00f5es. Mas para completar o que disse antes, est\u00e1 tudo a ser feito, e obviamente tornou-se mais do que uma necessidade quando olhamos para as amea\u00e7as, a mais \u00f3bvia de todas \u00e9 fevereiro de 2022 e o brutal ataque da R\u00fassia \u00e0 Ucr\u00e2nia.Acredita que esse ataque mudou a forma como a recolha e partilha de informa\u00e7\u00f5es \u00e9 vista no processo de decis\u00e3o da UE?Sem d\u00favida. E um dos melhores exemplos n\u00e3o est\u00e1 necessariamente na UE. Os servi\u00e7os secretos dos EUA e a comunidade de servi\u00e7os secretos do Reino Unido come\u00e7aram a comunicar informa\u00e7\u00f5es publicamente, o que \u00e9 uma mudan\u00e7a importante. Isso \u00e9 algo com que os Estados-membros e a UE t\u00eam muito a aprender.Isso foi tamb\u00e9m uma tentativa de a\u00e7\u00e3o preventiva. Como que dizendo ao outro lado \u201csabemos que est\u00e3o a fazer isto, por isso n\u00e3o o fa\u00e7am\u2019.Exatamente.E n\u00e3o funcionou.N\u00e3o funcionou mas... concordo consigo. E h\u00e1 muitas opini\u00f5es diferentes na comunidade dos servi\u00e7os secretos. N\u00e3o \u00e9 segredo. Muitos servi\u00e7os da UE estavam convencidos de que [a invas\u00e3o] n\u00e3o aconteceria. Quando aconteceu, muitas pessoas ficaram surpreendidas. Mas se tentarmos refletir sobre as mensagens enviadas pelos nossos amigos do B\u00e1ltico, eles disseram-nos. S\u00f3 t\u00ednhamos de os ouvir. Putin foi muito claro em todas as interven\u00e7\u00f5es. E o mesmo se a com outras partes da Europa, por exemplo nos Balc\u00e3s Ocidentais. Pessoas como Putin t\u00eam tanto orgulho nas suas informa\u00e7\u00f5es. Ele est\u00e1 t\u00e3o orgulhoso do seu pr\u00f3prio ado nos servi\u00e7os secretos... Na UE a intelig\u00eancia \u00e9 um pouco... uma palavra suja. Quando se fala de informa\u00e7\u00f5es, sussurra-se. N\u00e3o se deve sussurrar. Quando nos encontramos com o chefe dos servi\u00e7os secretos, n\u00e3o temos de nos encontrar com ele \u00e0 noite. Tem-se uma reuni\u00e3o normal. Os servi\u00e7os secretos nunca ser\u00e3o a ferramenta principal de qualquer decisor pol\u00edtico, mas s\u00e3o uma das ferramentas espec\u00edficas importantes que ele tem. E penso que os decisores da UE tamb\u00e9m t\u00eam de a ter. Por isso, temos de encontrar formas de lhes fazer chegar a informa\u00e7\u00e3o. \u00c9 importante referir que, mesmo nas institui\u00e7\u00f5es europeias, existem pessoas brilhantes a trabalhar em quest\u00f5es de seguran\u00e7a. Mas as informa\u00e7\u00f5es \u00e9 uma \u00e1rea muito espec\u00edfica. Utilizam-se t\u00e9cnicas espec\u00edficas, meios espec\u00edficos para obter informa\u00e7\u00f5es.Que o INTCEN n\u00e3o pode fazer.Sim. Mas temos uma comunidade muito forte de 27 Estados-membros. Uma das especificidades da seguran\u00e7a e dos servi\u00e7os de informa\u00e7\u00f5es na UE \u2013 e talvez por isso \u00e0s vezes seja um pouco dif\u00edcil \u2013, \u00e9 que h\u00e1 grandes diferen\u00e7as. Quando olhamos para qualquer institui\u00e7\u00e3o dos Estados-membros, para os minist\u00e9rios, estes s\u00e3o semelhantes ou iguais em todos os pa\u00edses. O minist\u00e9rio da Agricultura em Portugal \u00e9 semelhante ao da Alemanha. Ou o da Defesa. A comunidade de seguran\u00e7a e de informa\u00e7\u00f5es \u00e9 diferente. Todos t\u00eam um quadro jur\u00eddico diferente.E diferentes capacidades e possibilidades. H\u00e1 coisas que os ses podem fazer que os portugueses n\u00e3o podem.Exatamente. Mas temos a capacidade de aproveitar o melhor de cada servi\u00e7o para o bem comum. \u00c9 esse o papel do INTCEN e do SIAC. Quando era chefe da minha ag\u00eancia nacional, trabalhava diretamente para o Presidente e para o Primeiro-Ministro, o que n\u00e3o \u00e9 f\u00e1cil, como deve calcular. Mas para mim, se temos informa\u00e7\u00f5es, \u00e9 para agir, para as utilizar ou para reagir. Ter informa\u00e7\u00f5es s\u00f3 para a base de dados \u00e9 in\u00fatil. O mesmo se a na UE. Precisamos de dar a informa\u00e7\u00e3o ao decisor, especificamente \u00e0 Alta Representante para a Pol\u00edtica Externa Kaja Kallas, mas tamb\u00e9m \u00e0 Presidente von der Leyen e ao Presidente Ant\u00f3nio Costa. Todos esses atores t\u00eam de ter os dados certos, no momento certo, durante o processo de tomada de decis\u00e3o. A UE \u00e9 um ator forte.Como age quando h\u00e1 um conflito de informa\u00e7\u00f5es enviadas por diferentes pa\u00edses?Em termos de informa\u00e7\u00f5es n\u00e3o \u00e9 algo que aconte\u00e7a com frequ\u00eancia. Podemos ter posi\u00e7\u00f5es diferentes, uma decis\u00e3o pol\u00edtica diferente. Mas em termos de informa\u00e7\u00f5es em bruto isso n\u00e3o acontece muitas vezes. Al\u00e9m disso, a UE tem uma especificidade. A intelig\u00eancia na UE n\u00e3o est\u00e1 t\u00e3o estruturada como na NATO, especialmente desde a reforma dos servi\u00e7os de informa\u00e7\u00f5es realizada h\u00e1 10 anos na NATO. Mas temos uma vantagem. N\u00e3o precisamos necessariamente que as informa\u00e7\u00f5es sejam concordantes entre todos os Estados. Temos de ter a capacidade de utilizar a informa\u00e7\u00e3o fornecida por um servi\u00e7o, uma comunidade ou um grupo de servi\u00e7os e utiliz\u00e1-la. E \u00e9 isso que estamos a fazer.Consegue avaliar se havia diferen\u00e7as na forma como intelligence era vista antes e depois da invas\u00e3o russa da Ucr\u00e2nia?Houve definitivamente uma mudan\u00e7a. E, mais uma vez, voltando ao facto de as informa\u00e7\u00f5es estarem \u00e0 vista de todos e \u00e0 necessidade de as utilizar. Esta agress\u00e3o, que n\u00e3o \u00e9 apenas uma guerra, \u00e9 um choque civilizacional a longo prazo, mudou a forma como pensamos os servi\u00e7os de informa\u00e7\u00f5es e usamos os servi\u00e7os de informa\u00e7\u00f5es.O relat\u00f3rio Niinist\u00f6\u00a0 [sobre fortalecimento da prepara\u00e7\u00e3o e prontid\u00e3o civis e de defesa da Europa]defendeu a necessidade de fortalecer a partilha de informa\u00e7\u00f5es.No relat\u00f3rio encontra uma parte sobre a SIAC. O relat\u00f3rio foi um grande esfor\u00e7o para encontrar uma nova solu\u00e7\u00e3o que analisasse as novas amea\u00e7as. Um dos problemas prendia-se, de facto, com o facto de os servi\u00e7os n\u00e3o serem suficientemente vis\u00edveis. E \u00e9 esse o problema. E \u00e9 por isso que, na minha comunica\u00e7\u00e3o com todos os servi\u00e7os, como fiz ontem no vosso servi\u00e7o externo, falei da necessidade de comunicar mais. O meu servi\u00e7o, quando assumi fun\u00e7\u00f5es h\u00e1 nove anos, era muito bom, mas muito fechado, sem comunica\u00e7\u00e3o, pelo que a imagem n\u00e3o era muito boa. Mud\u00e1mos isso atrav\u00e9s de iniciativas diferentes. Fizemos um relat\u00f3rio p\u00fablico, comunic\u00e1mos por vezes com os meios de comunica\u00e7\u00e3o social. Penso que \u00e9 o que a comunidade deve fazer na Europa. Portanto, mais uma vez, a subst\u00e2ncia ser\u00e1 sempre para o decisor. Mas o facto de cooperarmos, de termos informa\u00e7\u00f5es \u2013 n\u00e3o \u00e9 s\u00f3 o outro lado [que as tem], o que quer que eles fa\u00e7am, n\u00f3s podemos fazer ainda melhor \u2013, temos de comunicar sobre isto.Imagina que o INTCEN ser\u00e1 uma esp\u00e9cie de Servi\u00e7o de Informa\u00e7\u00f5es Europeu?\u00c9-me dif\u00edcil dizer. Mais uma vez, voltaria ao famoso artigo 4.2 do Tratado da UE. N\u00e3o me parece que v\u00e1 acontecer porque fazer intelligence, especialmente no estrangeiro, requer para al\u00e9m do know-how, muitos elementos. No ambiente da UE, seria dif\u00edcil. As institui\u00e7\u00f5es da UE s\u00e3o muito transparentes, como devem ser, mas ainda temos de aumentar a sensibiliza\u00e7\u00e3o para as quest\u00f5es de seguran\u00e7a. Organizar miss\u00f5es como essa a partir de algum lugar na UE parece-me dif\u00edcil.Temos ouvido falar muito sobre o fortalecimento da defesa europeia mas n\u00e3o temos ouvido falar na parte das informa\u00e7\u00f5es.Houve uma iniciativa de refor\u00e7o das informa\u00e7\u00f5es, que foi iniciada h\u00e1 tr\u00eas anos pelos Estados-membros, e estamos a trabalhar nisso. Cri\u00e1mos um documento conjunto sobre o refor\u00e7o da SIAC, um documento conjunto do Alto Representante e dos Estados. Portanto, h\u00e1 uma iniciativa. \u00c9 menos vis\u00edvel porque a defesa exige muito dinheiro. Em termos de informa\u00e7\u00f5es, precisamos de mais dinheiro, mas n\u00e3o se pode comparar.Quais s\u00e3o para si as principais amea\u00e7as \u00e0 seguran\u00e7a europeia?Em primeiro lugar\u00a0 voltarei ao tema da agress\u00e3o russa: trata-se de um choque de civiliza\u00e7\u00f5es, porque temos a agress\u00e3o em si, temos as atividades hibridas russas, mesmo em Estados-membros da UE, que por vezes podem ser atividades cin\u00e9ticas.Sabotagem?Entre outras.De que g\u00e9nero?Relat\u00e1mos atividades na Litu\u00e2nia, os pacotes que explodiram no Reino Unido, algumas tentativas de assassinato e outras atividades. Talvez tenhamos tend\u00eancia para esquecer, em primeiro lugar, os ciberataques. Os russos s\u00e3o especialistas em ataques cibern\u00e9ticos, juntamente com os seus grupos criminosos. E espionagem. Em Bruxelas tentamos lembrar a todos a import\u00e2ncia da seguran\u00e7a e que a espionagem existe.Estatal ou industrial?Todos os tipos, dependendo do ator. Temos a R\u00fassia, mas tamb\u00e9m outros atores. E quando olhamos para o que aconteceu h\u00e1 alguns dias na \u00cdndia e no Paquist\u00e3o, o que tem acontecido em \u00c1frica, podemos ver que h\u00e1 cada vez mais amea\u00e7as. N\u00e3o mencionei o M\u00e9dio Oriente, mas \u00e9 \u00f3bvio que \u00e9 importante. E n\u00e3o posso deixar de pensar na opera\u00e7\u00e3o que os russos est\u00e3o a realizar na Ucr\u00e2nia e na rea\u00e7\u00e3o do mundo, da UE, dos EUA: \u00e9 \u00f3bvio que muitos atores est\u00e3o a assistir a tudo nos \u00faltimos tr\u00eas anos e talvez se sintam tentados a fazer alguma coisa.Podem pensar que se os russos podem fazer, eles tamb\u00e9m?Definitivamente. E h\u00e1 tantos conflitos, tantas tens\u00f5es, que o facto de [n\u00e3o se saber] quem \u00e9 o principal ator que os pode travar tamb\u00e9m \u00e9 um elemento.T\u00eam tamb\u00e9m um papel no combate \u00e0 desinforma\u00e7\u00e3o e propaganda?Sim, n\u00e3o somos os \u00fanicos, h\u00e1 outros organismos na UE que est\u00e3o a trabalhar nisso.Tivemos um caso recente em Portugal durante o apag\u00e3o. Em menos de uma hora havia uma not\u00edcia falsa a ser espalhada em grupos de WhatsApp e nas redes sociais atribuindo a falha de energia a um ciberataque russo.H\u00e1 uma tend\u00eancia para fazer demasiadas atribui\u00e7\u00f5es e fazer de Putin um verdadeiro super-homem. Temos uma vis\u00e3o clara, mais uma vez trabalhando em conjunto com as 27 comunidades, do que a R\u00fassia est\u00e1 a fazer e como o faz. Por isso \u00e9 bom sermos claros e n\u00e3o tentarmos encontrar a R\u00fassia atr\u00e1s de cada pedra. Putin iria adorar. Teria de utilizar muito poucos recursos e usar apenas as redes sociais para mostrar a sua for\u00e7a.Reparei que n\u00e3o mencionou o terrorismo como uma amea\u00e7a.Por causa desta crise aguda n\u00e3o falamos de terrorismo, mas a luta contra o terrorismo \u00e9 uma das principais tarefas dos servi\u00e7os de seguran\u00e7a. Continua a ser sempre uma prioridade, mas algumas crises s\u00e3o agora mais vis\u00edveis.Mas acredita que grupos como o Estado Isl\u00e2mico ou a Al Qaeda ainda t\u00eam alguma influ\u00eancia nos cora\u00e7\u00f5es e mentes de algumas pessoas na nossa comunidade?Definitivamente. E nesse sentido, quando essas quest\u00f5es est\u00e3o menos nos media, talvez haja menos jovens tentados a seguir os os desses movimentos. Mas existe e posso dizer-lhe que os servi\u00e7os de informa\u00e7\u00f5es na UE est\u00e3o ativos nesse t\u00f3pico.Como v\u00ea a possibilidade do regresso \u00e0 Europa dos combatentes terroristas estrangeiros e das suas fam\u00edlias que anda est\u00e3o em campos e pris\u00f5es na S\u00edria e Iraque?\u00c9 uma quest\u00e3o muito importante. Resta saber o que os EUA v\u00e3o fazer na S\u00edria, o que \u00e9 que vai acontecer com as pris\u00f5es.Porque ainda h\u00e1 milhares de pessoas na S\u00edria.Exatamente. O que \u00e9 que a Turquia vai fazer. H\u00e1 muitas d\u00favidas, mas estamos todos a trabalhar nisso.Deve haver uma posi\u00e7\u00e3o comum entre os Estados-membros?Acho que temos todos uma posi\u00e7\u00e3o muito semelhante.H\u00e1 pa\u00edses que j\u00e1 repatriaram pessoas. Outros, como Portugal, n\u00e3o.Sim, mas a diferen\u00e7a de n\u00fameros entre pa\u00edses pode ser enorme. H\u00e1 pa\u00edses muito mais preocupados. N\u00e3o s\u00f3 por causa do n\u00famero de combatentes mas tamb\u00e9m das mulheres e crian\u00e7as.Se continuarem nos campos, essas crian\u00e7as podem ser a pr\u00f3xima gera\u00e7\u00e3o de terroristas?Definitivamente. Diria s\u00f3 isso porque n\u00e3o gostaria de dar um ponto de vista pol\u00edtico. Mas em termos de seguran\u00e7a, o que lhes pode acontecer \u00e9 uma grande quest\u00e3o. N\u00e3o s\u00f3 se ficarem mas mesmo se voltarem \u00e0 Europa.Uma \u00faltima quest\u00e3o. Nesse grupo de 27 pa\u00edses, qual \u00e9 para si o papel dos servi\u00e7os portugueses?Como diretor de um servi\u00e7o nacional tinha rela\u00e7\u00f5es muito estreitas com os diretores dos servi\u00e7os portugueses. E estou muito grato ao meu antecessor na dire\u00e7\u00e3o do INTCEN Jos\u00e9 Casimiro Morgado. Conhecemo-nos h\u00e1 muito tempo. Tudo o que fa\u00e7o agora \u00e9 baseado no trabalho dele e estou muito grato por poder suceder-lhe. Sobre Portugal, falei ontem com o secret\u00e1rio-Geral do Sistema de Informa\u00e7\u00f5es [V\u00edtor Sereno] e com os dois diretores [Ad\u00e9lio Neiva da Cruz e Pedro Marinho da Costa]. Portugal, quando olhamos para algumas das pot\u00eancias da UE, \u00e9 um pa\u00eds relativamente pequeno, com servi\u00e7os relativamente pequenos, mas que s\u00e3o incrivelmente eficientes. E o alcance quase global \u00e9 para mim absolutamente fascinante. A comunidade portuguesa dos servi\u00e7os secretos pode dar muito e est\u00e1 a dar muito pela seguran\u00e7a europeia.Por causa da l\u00edngua?Por causa da sua capacidade. Obviamente a l\u00edngua, a hist\u00f3ria e os la\u00e7os econ\u00f3micos t\u00eam influ\u00eancia mas o facto \u00e9 que os servi\u00e7os est\u00e3o a ter resultados. 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"Há uma tendência para fazer de Putin um verdadeiro super-homem", diz diretor das “secretas” da UE

 Daniel Markic, diretor do EU INTCEN
Daniel Markic, diretor do EU INTCEN Direitos de autor Bruno Gonçalves/Nascer do Sol
Direitos de autor Bruno Gonçalves/Nascer do Sol
De Nuno Tiago Pinto
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O responsável pelas “secretas” europeias acredita que a invasão russa da Ucrânia mudou a forma como pensamos e usamos os serviços de informações e defende que a UE pode fazer mais nessa área – e que os Estados-membros estão disponíveis para isso.

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Daniel Markić foi nomeado há poucos meses diretor do Centro de Situação e Inteligência da União Europeia (EU INTCEN), o mais próximo que existe de um serviço de informações europeus, após nove anos à frente das secretas croatas.

Na dependência da Alta Representante para a Política Externa, Kaja Kallas, o INTCEN – que foi anteriormente dirigido pelo português José Casimiro Morgado – tem a missão de monitorizar o que acontece dentro e fora da UE e fornecer análises e alertas às instituições, decisores e Estados-membros na área da segurança, defesa e contra terrorismo.

De agem por Lisboa para participar numa conferência inserida nas comemorações dos 30 anos do Serviço de Informações Estratégicas e de Defesa (SIED), deu uma entrevista exclusiva ao Nascer do SOL e à Euronews na qual identifica as principais ameaças à segurança da União Europeia (UE), a cooperação entre serviços de informações e explica o que considera ser o futuro do setor.

Qual o papel do INTCEN na UE?

Nos últimos 20 anos o INTCEN tem sido uma espécie de centro de fusão de informações da União Europeia. Costumava fazer parte do Conselho, mas com as diferentes reformas das instituições agora faz parte do Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE). As pessoas que trabalham no INTCEN provêm na maioria dos serviços de segurança e de informações dos Estados-membros e trabalhamos de forma muito próxima com as informações militares [EUMS Intelligence Directorate], sob um chapéu informal chamado SIAC, Single Intelligence and Analysis Capacity – e funciona muito bem. Mas agora achamos que o que está a ser feito em termos de informações pode não ser suficiente.

Porquê?

Temos de fazer mais. A UE compreendeu há uns anos que não é apenas um ator político e económico global, mas que é potencialmente um ator em termos de segurança. Em 2020 foi feita a primeira análise de ameaças, nomeadamente pela SIAC. Ela foi revista em 2022 e fizemos uma terceira versão há uns meses. Isso prova que a UE estava a tentar pensar sobre as ameaças para encontrar soluções para as enfrentar.

Está a falar de ameaças civis ou militares? Porque quando pensamos em ameaças militares pensamos também na NATO.

Globalmente, sobre todas as ameaças. E depois existe o  famoso documento estratégico, a Bússola Estratégica [documento aprovado em 22 de março de 2022 que fornece orientações e uma visão comum para reforçar a política de segurança e defesa da UE até 2030], que descreve, mais uma vez, a capacidade da UE. E_é aí que encontramos uma pequena parte do documento que refere o SIAC como sendo o único ponto de entrada de informações estratégicas na UE. Temos que nos lembrar que em termos de informações, para os Estados-membros há um artigo importante no Tratado da União Europeia, o 4.2, que diz que a segurança nacional é uma competência dos Estados. Sabendo tudo isso, temos que encontrar maneiras de dar mais. A UE precisa de mais. E os Estados-membros estão disponíveis para dar mais.

Estão?

Sim, estão.

É que a partilha de informações foi sempre um tema sensível?

É sensível. Mas existe e funciona muito bem. Digo isto não apenas como diretor do INTCEN mas trabalhei os últimos nove anos como diretor de um serviço nacional de informações e segurança. E funciona. Mas quando há uma sensação de que os serviços não fazem o suficiente com frequência é porque eles não comunicam o suficiente. Temos de dar mais visibilidade às informações. Mas para completar o que disse antes, está tudo a ser feito, e obviamente tornou-se mais do que uma necessidade quando olhamos para as ameaças, a mais óbvia de todas é fevereiro de 2022 e o brutal ataque da Rússia à Ucrânia.

Daniel Markic, diretor do EU INTCEN
Daniel Markic, diretor do EU INTCENBruno Gonçalves/Nascer do Sol

Acredita que esse ataque mudou a forma como a recolha e partilha de informações é vista no processo de decisão da UE?

Sem dúvida. E um dos melhores exemplos não está necessariamente na UE. Os serviços secretos dos EUA e a comunidade de serviços secretos do Reino Unido começaram a comunicar informações publicamente, o que é uma mudança importante. Isso é algo com que os Estados-membros e a UE têm muito a aprender.

Isso foi também uma tentativa de ação preventiva. Como que dizendo ao outro lado “sabemos que estão a fazer isto, por isso não o façam’.

Exatamente.

E não funcionou.

Não funcionou mas... concordo consigo. E há muitas opiniões diferentes na comunidade dos serviços secretos. Não é segredo. Muitos serviços da UE estavam convencidos de que [a invasão] não aconteceria. Quando aconteceu, muitas pessoas ficaram surpreendidas. Mas se tentarmos refletir sobre as mensagens enviadas pelos nossos amigos do Báltico, eles disseram-nos. Só tínhamos de os ouvir. Putin foi muito claro em todas as intervenções. E o mesmo se a com outras partes da Europa, por exemplo nos Balcãs Ocidentais. Pessoas como Putin têm tanto orgulho nas suas informações. Ele está tão orgulhoso do seu próprio ado nos serviços secretos... Na UE a inteligência é um pouco... uma palavra suja. Quando se fala de informações, sussurra-se. Não se deve sussurrar. Quando nos encontramos com o chefe dos serviços secretos, não temos de nos encontrar com ele à noite. Tem-se uma reunião normal. Os serviços secretos nunca serão a ferramenta principal de qualquer decisor político, mas são uma das ferramentas específicas importantes que ele tem. E penso que os decisores da UE também têm de a ter. Por isso, temos de encontrar formas de lhes fazer chegar a informação. É importante referir que, mesmo nas instituições europeias, existem pessoas brilhantes a trabalhar em questões de segurança. Mas as informações é uma área muito específica. Utilizam-se técnicas específicas, meios específicos para obter informações.

Que o INTCEN não pode fazer.

Sim. Mas temos uma comunidade muito forte de 27 Estados-membros. Uma das especificidades da segurança e dos serviços de informações na UE – e talvez por isso às vezes seja um pouco difícil –, é que há grandes diferenças. Quando olhamos para qualquer instituição dos Estados-membros, para os ministérios, estes são semelhantes ou iguais em todos os países. O ministério da Agricultura em Portugal é semelhante ao da Alemanha. Ou o da Defesa. A comunidade de segurança e de informações é diferente. Todos têm um quadro jurídico diferente.

E diferentes capacidades e possibilidades. Há coisas que os ses podem fazer que os portugueses não podem.

Exatamente. Mas temos a capacidade de aproveitar o melhor de cada serviço para o bem comum. É esse o papel do INTCEN e do SIAC. Quando era chefe da minha agência nacional, trabalhava diretamente para o Presidente e para o Primeiro-Ministro, o que não é fácil, como deve calcular. Mas para mim, se temos informações, é para agir, para as utilizar ou para reagir. Ter informações só para a base de dados é inútil. O mesmo se a na UE. Precisamos de dar a informação ao decisor, especificamente à Alta Representante para a Política Externa Kaja Kallas, mas também à Presidente von der Leyen e ao Presidente António Costa. Todos esses atores têm de ter os dados certos, no momento certo, durante o processo de tomada de decisão. A UE é um ator forte.

Como age quando há um conflito de informações enviadas por diferentes países?

Em termos de informações não é algo que aconteça com frequência. Podemos ter posições diferentes, uma decisão política diferente. Mas em termos de informações em bruto isso não acontece muitas vezes. Além disso, a UE tem uma especificidade. A inteligência na UE não está tão estruturada como na NATO, especialmente desde a reforma dos serviços de informações realizada há 10 anos na NATO. Mas temos uma vantagem. Não precisamos necessariamente que as informações sejam concordantes entre todos os Estados. Temos de ter a capacidade de utilizar a informação fornecida por um serviço, uma comunidade ou um grupo de serviços e utilizá-la. E é isso que estamos a fazer.

Consegue avaliar se havia diferenças na forma como intelligence era vista antes e depois da invasão russa da Ucrânia?

Houve definitivamente uma mudança. E, mais uma vez, voltando ao facto de as informações estarem à vista de todos e à necessidade de as utilizar. Esta agressão, que não é apenas uma guerra, é um choque civilizacional a longo prazo, mudou a forma como pensamos os serviços de informações e usamos os serviços de informações.

Esta agressão, que não é apenas uma guerra, é um choque civilizacional a longo prazo, mudou a forma como pensamos os serviços de informações e usamos os serviços de informações
Daniel Markic
Diretor do EU INTCEN

O relatório Niinistö  [sobre fortalecimento da preparação e prontidão civis e de defesa da Europa]defendeu a necessidade de fortalecer a partilha de informações.

No relatório encontra uma parte sobre a SIAC. O relatório foi um grande esforço para encontrar uma nova solução que analisasse as novas ameaças. Um dos problemas prendia-se, de facto, com o facto de os serviços não serem suficientemente visíveis. E é esse o problema. E é por isso que, na minha comunicação com todos os serviços, como fiz ontem no vosso serviço externo, falei da necessidade de comunicar mais. O meu serviço, quando assumi funções há nove anos, era muito bom, mas muito fechado, sem comunicação, pelo que a imagem não era muito boa. Mudámos isso através de iniciativas diferentes. Fizemos um relatório público, comunicámos por vezes com os meios de comunicação social. Penso que é o que a comunidade deve fazer na Europa. Portanto, mais uma vez, a substância será sempre para o decisor. Mas o facto de cooperarmos, de termos informações – não é só o outro lado [que as tem], o que quer que eles façam, nós podemos fazer ainda melhor –, temos de comunicar sobre isto.

Imagina que o INTCEN será uma espécie de Serviço de Informações Europeu?

É-me difícil dizer. Mais uma vez, voltaria ao famoso artigo 4.2 do Tratado da UE. Não me parece que vá acontecer porque fazer intelligence, especialmente no estrangeiro, requer para além do know-how, muitos elementos. No ambiente da UE, seria difícil. As instituições da UE são muito transparentes, como devem ser, mas ainda temos de aumentar a sensibilização para as questões de segurança. Organizar missões como essa a partir de algum lugar na UE parece-me difícil.

Temos ouvido falar muito sobre o fortalecimento da defesa europeia mas não temos ouvido falar na parte das informações.

Houve uma iniciativa de reforço das informações, que foi iniciada há três anos pelos Estados-membros, e estamos a trabalhar nisso. Criámos um documento conjunto sobre o reforço da SIAC, um documento conjunto do Alto Representante e dos Estados. Portanto, há uma iniciativa. É menos visível porque a defesa exige muito dinheiro. Em termos de informações, precisamos de mais dinheiro, mas não se pode comparar.

Quais são para si as principais ameaças à segurança europeia?

Em primeiro lugar  voltarei ao tema da agressão russa: trata-se de um choque de civilizações, porque temos a agressão em si, temos as atividades hibridas russas, mesmo em Estados-membros da UE, que por vezes podem ser atividades cinéticas.

Sabotagem?

Entre outras.

De que género?

Relatámos atividades na Lituânia, os pacotes que explodiram no Reino Unido, algumas tentativas de assassinato e outras atividades. Talvez tenhamos tendência para esquecer, em primeiro lugar, os ciberataques. Os russos são especialistas em ataques cibernéticos, juntamente com os seus grupos criminosos. E espionagem. Em Bruxelas tentamos lembrar a todos a importância da segurança e que a espionagem existe.

Estatal ou industrial?

Todos os tipos, dependendo do ator. Temos a Rússia, mas também outros atores. E quando olhamos para o que aconteceu há alguns dias na Índia e no Paquistão, o que tem acontecido em África, podemos ver que há cada vez mais ameaças. Não mencionei o Médio Oriente, mas é óbvio que é importante. E não posso deixar de pensar na operação que os russos estão a realizar na Ucrânia e na reação do mundo, da UE, dos EUA: é óbvio que muitos atores estão a assistir a tudo nos últimos três anos e talvez se sintam tentados a fazer alguma coisa.

Podem pensar que se os russos podem fazer, eles também?

Definitivamente. E há tantos conflitos, tantas tensões, que o facto de [não se saber] quem é o principal ator que os pode travar também é um elemento.

Têm também um papel no combate à desinformação e propaganda?

Sim, não somos os únicos, há outros organismos na UE que estão a trabalhar nisso.

Tivemos um caso recente em Portugal durante o apagão. Em menos de uma hora havia uma notícia falsa a ser espalhada em grupos de WhatsApp e nas redes sociais atribuindo a falha de energia a um ciberataque russo.

Há uma tendência para fazer demasiadas atribuições e fazer de Putin um verdadeiro super-homem. Temos uma visão clara, mais uma vez trabalhando em conjunto com as 27 comunidades, do que a Rússia está a fazer e como o faz. Por isso é bom sermos claros e não tentarmos encontrar a Rússia atrás de cada pedra. Putin iria adorar. Teria de utilizar muito poucos recursos e usar apenas as redes sociais para mostrar a sua força.

É bom sermos claros e não tentarmos encontrar a Rússia atrás de cada pedra. Putin iria adorar. Teria de utilizar muito poucos recursos e usar apenas as redes sociais para mostrar a sua força
Daniel Markic
Diretor do EU INTCEN

Reparei que não mencionou o terrorismo como uma ameaça.

Por causa desta crise aguda não falamos de terrorismo, mas a luta contra o terrorismo é uma das principais tarefas dos serviços de segurança. Continua a ser sempre uma prioridade, mas algumas crises são agora mais visíveis.

Mas acredita que grupos como o Estado Islâmico ou a Al Qaeda ainda têm alguma influência nos corações e mentes de algumas pessoas na nossa comunidade?

Definitivamente. E nesse sentido, quando essas questões estão menos nos media, talvez haja menos jovens tentados a seguir os os desses movimentos. Mas existe e posso dizer-lhe que os serviços de informações na UE estão ativos nesse tópico.

Daniel Markic, diretor do EU INTCEN
Daniel Markic, diretor do EU INTCENBruno Gonçalves/Nacer do Sol

Como vê a possibilidade do regresso à Europa dos combatentes terroristas estrangeiros e das suas famílias que anda estão em campos e prisões na Síria e Iraque?

É uma questão muito importante. Resta saber o que os EUA vão fazer na Síria, o que é que vai acontecer com as prisões.

Porque ainda há milhares de pessoas na Síria.

Exatamente. O que é que a Turquia vai fazer. Há muitas dúvidas, mas estamos todos a trabalhar nisso.

Deve haver uma posição comum entre os Estados-membros?

Acho que temos todos uma posição muito semelhante.

Há países que já repatriaram pessoas. Outros, como Portugal, não.

Sim, mas a diferença de números entre países pode ser enorme. Há países muito mais preocupados. Não só por causa do número de combatentes mas também das mulheres e crianças.

Se continuarem nos campos, essas crianças podem ser a próxima geração de terroristas?

Definitivamente. Diria só isso porque não gostaria de dar um ponto de vista político. Mas em termos de segurança, o que lhes pode acontecer é uma grande questão. Não só se ficarem mas mesmo se voltarem à Europa.

Uma última questão. Nesse grupo de 27 países, qual é para si o papel dos serviços portugueses?

Como diretor de um serviço nacional tinha relações muito estreitas com os diretores dos serviços portugueses. E estou muito grato ao meu antecessor na direção do INTCEN José Casimiro Morgado. Conhecemo-nos há muito tempo. Tudo o que faço agora é baseado no trabalho dele e estou muito grato por poder suceder-lhe. Sobre Portugal, falei ontem com o secretário-Geral do Sistema de Informações [Vítor Sereno] e com os dois diretores [Adélio Neiva da Cruz e Pedro Marinho da Costa]. Portugal, quando olhamos para algumas das potências da UE, é um país relativamente pequeno, com serviços relativamente pequenos, mas que são incrivelmente eficientes. E o alcance quase global é para mim absolutamente fascinante. A comunidade portuguesa dos serviços secretos pode dar muito e está a dar muito pela segurança europeia.

Por causa da língua?

Por causa da sua capacidade. Obviamente a língua, a história e os laços económicos têm influência mas o facto é que os serviços estão a ter resultados. Têm, na minha entidade, um papel muito importante.

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