O debate nacional sobre a independência da Gronelândia terá em conta a negociação de melhores condições na sua relação com a Dinamarca e a garantia de um investimento mais significativo por parte da UE.
Perante a pressão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para que a Gronelândia assuma o controlo do país, os líderes pró-independência estão a ser forçados a ponderar seriamente as implicações de deixarem de estar sob a égide da Dinamarca, numa altura de grande perigo geopolítico.
"De facto, estamos a falar de independência, mas o que significa independência? Ninguém é verdadeiramente independente", disse Maliina Abelsen, presidente da maior empresa da Gronelândia, a Royal Greenland - uma empresa de pesca estatal que representa mais de 95% das exportações da Gronelândia.
Tendo em conta as suas reservas de minerais essenciais, incluindo grafite, terras raras, níquel e ouro, o seu abastecimento de gás natural e uma localização no Ártico que serve de porta de entrada para navios e submarinos nucleares russos, a Gronelândia é cada vez mais vital para a segurança económica e militar da Europa e dos EUA.
Tendo em conta a concorrência, Abelsen afirmou que a Gronelândia precisa de garantir que os futuros investimentos irão permitir ao governo nacional intervir na regulamentação, em vez de oferecer às empresas externas uma situação de liberdade total.
A UE abriu um consulado em Nuuk, no ano ado, com o objetivo de melhorar o investimento. No entanto, a exploração das riquezas naturais da Gronelândia exige um investimento a longo prazo, o que implica o risco de alguns projetos de exploração não produzirem o retorno desejado. Muitas empresas afirmam que a UE é demasiado lenta e que, historicamente, tem sido relutante em fazer investimentos substanciais.
"Aberta ao investimento"
"Há anos que a UE olha para a Gronelândia em busca de minerais críticos e trouxe o Banco Europeu de Investimento [BEI] para o território para dar uma vista de olhos, mas são muito poucos os projetos em que o BEI está ativamente envolvido", afirmou Bent Olsvig Jensen, diretor-geral da Lumina Sustainable Materials.
"Certamente, nenhum nos últimos anos."
Segundo Olsvig-Jensen, parte do problema reside nas rigorosas regras de investimento do BEI, que, na sua opinião, deixam as oportunidades em aberto para serem exploradas por outros países, como a China ou os EUA.
"O BEI pode intervir quando o projeto se torna comercial e, basicamente, ninguém chegou assim tão longe, exceto nós."
De 2011 a 2016, Olsvig-Jensen foi CEO de empresas como a True North Gems Greenland, que obteve originalmente a licença de exploração da mina de rubis.
"Se a UE quer posicionar-se na Gronelândia, tem de agir mais depressa", disse, em declarações à Euronews. "A Gronelândia não tem uma postura fechada no que toca aos negócios; pelo contrário, estamos abertos."
"A Gronelândia gostaria que a UE investisse mais dinheiro. É óbvio que não temos o poder económico para fazê-lo, por isso, precisamos de muito mais investimento e de parceiros com quem possamos trabalhar."
A UE tem de mudar a sua visão relativamente às oportunidades de investimento, tendo em conta a importância geoestratégica da Gronelândia.
"Os chineses olham para gerações futuras, andam por aí a licitar tudo. Investiram numa licença de urânio em que são um investidor minoritário, que pode agora aumentar nos próximos anos", explicou.
"A UE precisa de pensar da mesma forma, mas espera um retorno dentro de cinco anos. Não o vêem como um investimento a longo prazo para impedir a entrada de outros. Deveriam refletir sobre o assunto com essa perspetiva", afirmou.
O grande degelo
A energia hidroelétrica é outra fonte de energia renovável em desenvolvimento na Gronelândia, graças ao degelo das calotas polares, provocado pelo aquecimento global.
"A calota polar está a derreter mais depressa do que se previa, por isso, o potencial é provavelmente maior", referiu à Euronews Aviaaja Karlshoj Knudsen, CEO da empresa de energias renováveis NunaGreen. "Vemos uma grande oportunidade para desenvolver um novo setor energético aqui na Gronelândia, baseado nas energias renováveis e na energia hidroelétrica."
"É muito importante que conheçamos e trabalhemos com parceiros em que confiemos e que os gronelandeses possam controlar."
Stine Boss, eurodeputada dinamarquesa do grupo Renew, afirmou que a UE poderia fazer mais para apoiar a Gronelândia na concretização do seu potencial.
"Com a União Europeia, as iniciativas que têm sido tomadas em matéria de educação e apoio ao setor das energias limpas mostram que estamos a levar isto a sério. E, de facto, também há dinheiro em cima da mesa, mas penso que podemos fazer melhor", mencionou, em declarações à Euronews.
Stine Boss fez parte do leque de eurodeputados que se reuniram com académicos, políticos e industriais, bem como com os consulados dos EUA e da UE na Gronelândia, para determinar como é que a UE pode dar um contributo mais significativo para Nuuk.
A eurodeputada ite que muitos na Europa e na Dinamarca esperavam que as propostas de Trump acabassem por cair no esquecimento.
"Penso que esta tem sido uma situação delicada e compreendo muito bem isso. O governo dinamarquês, desde o início, disse: 'Vamos ver, talvez e', o que não aconteceu. De facto, 'as vozes tornaram-se mais audíveis' por parte dos EUA."
Nos termos de um acordo de defesa com a Dinamarca, os EUA já têm uma forte presença militar no noroeste da Gronelândia.
O primeiro-ministro dinamarquês, Mette Frederiksen, afirmou que os EUA poderiam negociar uma presença mais forte na Gronelândia, especialmente se o objetivo for proteger a região das ameaças russas e chinesas.
"Concordo plenamente com os norte-americanos quando dizem que o Alto Norte, a região do Ártico, está a tornar-se cada vez mais importante quando falamos de defesa, segurança e dissuasão", afirmou Fredericksen numa cimeira da UE, na segunda-feira.