Christine Lagarde afirmou perante o Parlamento Europeu que a inflação está a abrandar e que os cortes nas taxas estão a produzir efeitos, mas alertou para os riscos comerciais. Sublinhou ainda a necessidade de um euro digital para reforçar a autonomia financeira da Europa.
A presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, afirmou que a inflação está a abrandar e que os recentes cortes nas taxas de juro estão a começar a produzir efeitos, mas alertou para o facto de a incerteza persistir, em especial no que se refere às fricções comerciais e às tensões geopolíticas.
"A maioria das medidas sugere que a inflação está a convergir para o nosso objetivo de forma sustentada", afirmou Lagarde durante o seu discurso perante o Parlamento Europeu na segunda-feira, referindo que a inflação da zona euro caiu para 2,5% em janeiro, contra 5,5% um ano antes.
Apesar dos progressos, Lagarde reafirmou a abordagem cautelosa do BCE: "Não nos comprometemos previamente com qualquer trajetória específica das taxas", disse, alertando para o facto de as perturbações no comércio mundial poderem ainda perturbar a trajetória da inflação.
Os comentários de Lagarde surgem depois de o BCE ter reduzido as taxas de juro em 125 pontos base desde junho de 2024, colocando a taxa da facilidade permanente de depósito em 2,75%.
A presidente do BCE sublinhou também a urgência de avançar com o euro digital, argumentando que um sistema de pagamentos regional reduziria a dependência da Europa de fornecedores externos e reforçaria a sua resiliência financeira.
Recuperação frágil num contexto de incerteza mundial
A economia da zona euro pouco se expandiu em 2024, com o produto interno bruto a aumentar apenas 0,9% em termos anuais.
O último trimestre do ano foi particularmente fraco, uma vez que a produção industrial estagnou e os gastos dos consumidores permaneceram moderados, apesar da melhoria dos rendimentos reais.
"A indústria transformadora continua sob pressão, mas os serviços estão a aguentar-se", observou Lagarde, oferecendo uma visão mista da economia da zona euro.
"A boa notícia é que os mercados de trabalho são resistentes", afirmou, apontando o aumento dos rendimentos reais e um mercado de trabalho sólido como potenciais motores da confiança dos consumidores. No entanto, "as famílias estão hesitantes em gastar mais" e o investimento empresarial continua fraco.
De acordo com Lagarde, a redução dos custos dos empréstimos deverá melhorar gradualmente as condições, tornando o crédito mais ível às empresas e às famílias. A procura externa poderá também proporcionar um alívio, mas as fricções no comércio mundial constituem uma ameaça potencial.
"Uma maior fricção no comércio mundial tornaria as perspetivas de inflação na zona euro mais incertas", afirmou Lagarde.
Porque é que o euro digital é importante para a autonomia da Europa
Para além da política monetária, Lagarde sublinhou a importância de reforçar a independência financeira da Europa, em particular nos pagamentos digitais. Observou que a Europa continua excessivamente dependente de fornecedores estrangeiros, deixando a região vulnerável a mudanças económicas e geopolíticas externas.
"Os pagamentos são a espinha dorsal da nossa economia e a Europa não se pode dar ao luxo de estar demasiado dependente de fornecedores externos", afirmou. O BCE está a avançar com planos para um euro digital, que complementaria o numerário físico, assegurando simultaneamente à Europa um sistema de pagamentos resiliente e soberano.
Lagarde apelou também ao progresso da integração dos mercados de capitais, argumentando que a eliminação das barreiras financeiras poderia desbloquear o investimento, fomentar o progresso tecnológico e apoiar o crescimento económico. "Com o enquadramento correto, a Europa pode mobilizar a sua vasta reserva de poupanças para financiar a sua própria inovação e progresso tecnológico", afirmou.
Sem pressa para futuros cortes nas taxas
Para os que esperavam uma orientação mais clara sobre os futuros cortes nas taxas de juro, a mensagem de Lagarde foi de paciência e flexibilidade.
"Seguiremos uma abordagem dependente dos dados e de reunião para reunião para determinar a orientação adequada da política monetária", afirmou, reforçando o compromisso do BCE de avaliar cuidadosamente as condições económicas antes de tomar novas medidas.
Indicou também que o BCE está a aperfeiçoar continuamente os seus modelos económicos para melhor se orientar num contexto em rápida mutação.
"Estamos a fazer o balanço de uma conjuntura de inflação e de um contexto económico alterados", afirmou, acrescentando que o BCE continua centrado na gestão do risco e da incerteza.
No final das suas observações, Lagarde deixou ao Parlamento um apelo claro à unidade europeia.
"A unidade europeia era o sonho de alguns. Tornou-se a esperança de muitos. Hoje é uma necessidade para todos nós", afirmou, sublinhando a necessidade de cooperação para enfrentar os desafios económicos.