Enquanto Israel fala da "necessidade de dissuadir o Irão antes que seja tarde demais" e o acusa de não cumprir as suas obrigações nucleares, Washington, de acordo com fugas de informação, parece preocupado com a possibilidade de Telavive lançar um ataque militar unilateral contra Teerão.
Perante a escalada acelerada entre o Irão, por um lado, e Israel e os Estados Unidos, por outro, os desenvolvimentos das últimas horas e dias levantam várias questões: Será que o que está a acontecer são apenas manobras de pressão sobre Teerão devido ao seu programa nuclear? Ou será que a região está perante um cenário de ataque militar surpresa que pode desencadear uma guerra regional abrangente? Netanyahu estará a arrastar Washington para uma guerra que serve os seus interesses políticos? E que dizer da aparente cautela de Trump?
Nesta investigação, analisamos a complexidade do cenário e discutimos as possíveis repercussões em diferentes frentes: Desde Gaza até ao Mar Vermelho, ando pelo Líbano, Iraque e Síria.
O que pensa a América de um ataque israelita contra o Irão?
Enquanto Israel fala da "necessidade de dissuadir o Irão antes que seja tarde demais" e o acusa de não cumprir as suas obrigações nucleares, Washington, de acordo com fugas de informação, parece preocupado com a possibilidade de Telavive lançar um ataque militar unilateral contra Teerão.
Donald Trump, avisou diretamente Netanyahu para não lançar um ataque imprudente contra o seu atual arqui-inimigo, sublinhando a necessidade de dar uma oportunidade à via diplomática. Por outro lado, não se esconde o desejo de Netanyahu de explorar a escalada para obter ganhos internos, especialmente face à desintegração da sua coligação e à possibilidade de regressar ao banco dos réus.
O Irão vai absorver o golpe ou retaliar?
Uma guerra com o Irão teria um custo elevado para os Estados Unidos. Em caso de conflito, as suas bases no Iraque, Kuwait, Qatar, Bahrein e Emirados Árabes Unidos seriam vulneráveis a ataques de mísseis iranianos. O comandante do IRGC, Hossein Salami, não escondeu: "Controlamos a profundidade dos alvos do inimigo e estamos preparados para qualquer cenário".
O ministro da Defesa iraniano, Aziz Nasserzadeh, também indicou que qualquer ataque não ficará sem resposta, prometendo bombardear as bases americanas na região.
Será que o Irão cumprirá as suas ameaças e atacará os alvos de que falou? E estará Washington preparado para entrar numa guerra que poderá ser a mais longa e complicada desde a invasão do Iraque?
A Sexta Frota... No centro da equação
A presença da Sexta Frota dos Estados Unidos no Mediterrâneo levanta questões sobre o seu papel em caso de guerra. Numa altura em que as ameaças aumentam, o destacamento desta frota parece reforçar a capacidade de Washington para agir rapidamente, mas também a torna um alvo direto para qualquer resposta iraniana.
Gaza e a guerra regional
No meio do ruído regional, os palestinianos da Faixa de Gaza receiam que a sua causa seja relegada para segundo plano. Uma guerra entre o Irão e os Estados Unidos da América/Israel desviaria os holofotes e a atenção internacionais do sofrimento dos habitantes de Gaza, que continuam a definhar sob o cerco. Tal poderia transformar Gaza numa "questão esquecida" no contexto de um grande confronto regional, com todos os custos humanitários associados.
Os Houthis entre o seu compromisso com Washington e os interesses do eixo anti-Washington
Os Houthis, que apoiam Gaza desde o início da guerra em outubro, atacando navios israelitas e ocidentais, chegaram a um acordo com os Estados Unidos para cessar os ataques no Mar Vermelho.
No entanto, caso se verifique um confronto entre o Irão e Israel, por um lado, e os Estados Unidos, por outro, será que os Houthis vão renegar este acordo? Que consequências teria para o comércio mundial? A possibilidade é forte, podendo novamente fazer subir os preços das matérias-primas e do petróleo e perturbar as rotas marítimas vitais.
Hezbollah: a calma antes da tempestade?
Apesar do acordo de cessar-fogo entre o Hezbollah e Israel, os ataques israelitas não pararam, alegadamente visando membros ou instalações do Hezbollah. Até à data, o Hezbollah tem mantido um silêncio militar.
Mas e se eclodir uma guerra de grandes proporções? A organização armada entrará em combate? Dispõe realmente de um arsenal suficiente, apesar dos recentes ataques israelitas? Há indícios de que o Hezbollah mantém uma capacidade ofensiva significativa, que poderá mais tarde traduzir-se em pressões sobre a fronteira norte de Israel.
O Iraque entre dois fogos
O Iraque encontra-se num momento muito sensível. As fações armadas leais a Teerão, lideradas pelas Brigadas Iraquianas do Hezbollah, mantêm-se prontas para antecipar qualquer desenvolvimento militar contra o Irão, o que levanta questões urgentes: serão estas facções a ponta de lança para atacar bases americanas ou interesses associados a Israel a partir do território iraquiano?
No entanto, o maior desafio com que Bagdade se depara não é apenas tomar uma posição decisiva em relação à crise, mas também encontrar um equilíbrio entre evitar um confronto destrutivo e manter a frágil estabilidade da segurança. Os relatórios de segurança indicam sérios receios de que o ISIS possa ressurgir, tirando partido da preocupação regional e da falta de segurança.
Neste contexto, o Iraque parece correr o risco de ser arrastado para um conflito em que não era parte, mas que pode subitamente tornar-se o centro de uma batalha que ultraa a sua capacidade de resistir ou de controlar o seu curso.
Síria está fora de cena, mas geograficamente presente
Desde que o presidente interino Ahmad al-Sharaa tomou o poder, a Síria tem assistido a uma mudança gradual na sua abordagem das relações regionais e internacionais, com uma abertura ao Ocidente e indícios de uma aproximação sem precedentes a Israel. Esta mudança, que ainda está a tomar forma, levanta uma questão central: à luz dos novos entendimentos, será o território sírio capaz de se tornar um corredor ou uma plataforma para eventuais operações militares em caso de conflito?
Por outro lado, este cenário não está isento de desafios internos. Os remanescentes do antigo regime procurarão aproveitar a nova situação para recuperar a sua influência, ao o que a renovada ameaça do ISIS representa uma ameaça real para a estabilidade. Quanto ao Presidente al-Sharaa, este enfrenta um teste fatídico: se a guerra rebentar, ficará à margem ou assumirá um papel ativo numa equação regional complexa?
Uma aliança com o Irão parece pouco provável à luz da nova trajetória política, tal como uma aliança contra Israel. Entre estas duas "impossibilidades", a região aguarda para ver como Damasco se irá posicionar na próxima fase.
Cálculos de ganhos e perdas e o impacto da batalha no interior do Irão?
Qualquer ataque militar contra o Irão não seria uma operação rápida nem fácil, mas sim um o repleto de enormes complicações estratégicas e de segurança. A eclosão de um confronto significaria a expansão do seu âmbito a múltiplas frentes, a perturbação generalizada dos equilíbrios regionais e a exposição de interesses vitais no Médio Oriente a golpes dolorosos.
No que diz respeito a Israel, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu pode ver na batalha uma oportunidade para escapar às suas crises políticas e judiciais internas e obter ganhos pessoais à custa da estabilidade da região. Quanto aos Estados Unidos, apesar do seu enorme poder militar, estão perante um momento decisivo: ou adotam uma política deliberada de dissuasão, ou serão arrastados para um conflito aberto que lhes poderá sair caro, sobretudo tendo em conta a instalação das suas bases militares na região que rodeia o Irão.
O interior do Irão, já exausto pelas sanções ocidentais e pelas pressões económicas acumuladas, será o primeiro a ser afetado por uma eventual guerra, que ameaça fazer explodir a situação interna e alargar o círculo da cólera popular, numa altura em que os dirigentes iranianos enfrentam um duplo teste: manter a coesão da frente interna e responder a qualquer ameaça externa.
A questão permanece: a região caminha para uma resolução da questão nuclear, apesar dos desafios, ou para uma explosão total?