O historiador Anthony Blunt confessou em 1964 ter espiado para os soviéticos, mas a falecida rainha só foi oficialmente informada em 1973.
A rainha Isabel II não foi informada, durante quase uma década, de que um historiador de arte da realeza, durante muito tempo no ativo, tinha confessado ser um espião soviético, de acordo com documentos recentemente desclassificados.
Os ficheiros sobre Anthony Blunt, um dos mais importantes conselheiros da falecida monarca, fazem parte de um conjunto de ficheiros da agência de informações MI5 que foram desclassificados pelos Arquivos Nacionais britânicos esta terça-feira.
Estes ficheiros revelam novos detalhes sobre os Cinco de Cambridge, uma rede de espionagem ligada à Universidade de Cambridge na década de 1930, cujos membros revelaram segredos à União Soviética a partir do coração dos serviços secretos do Reino Unido.
Blunt, que fazia parte dessa rede de espionagem, trabalhou como curador das pinturas da rainha de 1945 até se reformar em 1972.
Embora existissem há muito suspeitas sobre Blunt, o distinto historiador de arte só confessou que levava uma vida dupla em 1964, depois de lhe ter sido prometida imunidade de acusação. itiu que tinha transmitido informações à agência de espionagem russa KGB quando trabalhava como oficial superior do MI5 durante a Segunda Guerra Mundial.
O agente duplo disse também que tinha estado em o com os serviços secretos russos depois da guerra.
Na confissão de Blunt, este expressou um "profundo alívio" por ter confessado tudo, de acordo com os ficheiros recentemente divulgados, que também esclarecem o quanto a falecida rainha sabia sobre o ado do seu conselheiro artístico.
Um memorando mostra que o secretário privado da monarca, Martin Charteris, disse ao chefe do MI5, Michael Hanley, em 1972, que a rainha não tinha conhecimento da espionagem de Blunt, afirmando que informá-la "só iria aumentar as suas preocupações".
No ano seguinte, o governo de Edward Heath decidiu informar oficialmente a rainha sobre Blunt.
A decisão foi tomada porque o antigo espião estava doente com cancro e temia-se que, após a sua morte, os meios de comunicação social, já sem receio de potenciais processos por difamação, publicassem histórias sobre ele, a sua espionagem e trabalho para a família real.
Charteris afirma que a rainha recebeu a notícia "com muita calma e sem surpresa". A rainha, de facto, "lembrava-se que ele tinha estado sob suspeita no início dos anos 50", acrescentou.
No entanto, Miranda Carter, biógrafa de Blunt, considera que a rainha sabia a verdade sobre Blunt muito antes.
A história de Charteris deu à monarca "uma negação plausível", diz Carter.
"Teria sido extremamente embaraçoso se tivesse vindo a público e toda a gente tivesse sabido que ela sabia", acrescenta.
Blunt foi finalmente exposto como espião em 1979 pela então primeira-ministra britânica Margaret Thatcher na Câmara dos Comuns. O especialista em arte morreu com 75 anos em 1983, tendo-lhe sido retirado o título de cavaleiro.
Os ficheiros recentemente divulgados contêm também informações sobre outros membros dos famosos Cinco de Cambridge, que transmitiram segredos de Estado britânicos aos russos.
Kim Philby, um dos membros da rede de espionagem, foi confrontado em Beirute, em 1963, pelo seu amigo e colega do MI6, Nicholas Elliott, numa altura em que se acumulavam as provas contra ele.
Numa conversa gravada, cuja transcrição foi publicada pelos Arquivos Nacionais, Philby itiu ter traído Konstantin Volkov, um agente do KGB que tentou desertar para o Ocidente em 1945.
Como resultado das ações de Philby, Volkov e a sua mulher foram raptados em Istambul e levados à força para Moscovo, onde foram mortos.
"Senti de facto uma enorme lealdade para com o MI6. Fui muito, muito bem tratado e fiz amigos maravilhosos", disse Philby, de acordo com a transcrição. "Mas a grande inspiração vinha do outro lado."
Alguns dos documentos recentemente divulgados vão ser apresentados numa exposição dos Arquivos Nacionais - "MI5: Segredos Oficiais" - no fim deste ano.