Após uma deslocação à Coreia do Norte no início desta semana, o Presidente russo está no Vietname para uma visita de Estado em busca de reforçar parcerias no Sudeste Asiático, perante uma Rússia isolada no cenário internacional.
O presidente russo, Vladimir Putin, está no Vietname para uma visita de Estado, tendo em vista fortalecer os laços entre os dois países, numa altura em que Moscovo enfrenta um crescente isolamento a nível internacional devido à guerra na Ucrânia.
Putin foi recebido por dignitários quando chegou ao país do Sudeste Asiático, depois de ter estado na Coreia do Norte, onde se encontrou com o líder norte-coreano Kim Jong Un. Os dois am um acordo no qual se comprometem a prestar ajuda mútua em caso de guerra.
O pacto estratégico surge num momento em que ambos os países enfrentam confrontos crescentes com o Ocidente.
Putin chegou ao Palácio Presidencial do Vietname na tarde de quinta-feira, onde foi recebido pelo novo presidente To Lam. Na agenda do líder russo também está programado um encontro com o secretário-geral do Partido Comunista, Nguyen Phu Trong.
A Rússia está interessada em manter uma "cooperação estreita e eficaz" em energia, indústria, tecnologia, educação, segurança e comércio, disse o embaixador russo no Vietnam, Gennady S. Bezdetko, na quarta-feira, de acordo com a imprensa vietnamita.
A viagem de Putin ao Vietname mereceu a forte reprovação da Embaixada dos Estados Unidos no país.
Muito mudou desde a última visita de Putin ao Vietname em 2017. A Rússia agora enfrenta uma série de sanções dos países ocidentais após a invasão da Ucrânia. Em 2023, o Tribunal Penal Internacional de Haia emitiu um mandado de prisão para Putin por crimes de guerra. O Kremlin considerou-o "nulo e sem efeito", lembrando que Moscovo não reconhece a jurisdição do tribunal.
As recentes visitas de Putin à China e agora à Coreia do Norte e ao Vietname são tentativas de "romper o isolamento internacional", acredita Nguyen Khac Giang, analista do Instituto Ishak ISEAS-Yusof de Singapura.
Os EUA e seus aliados expressaram preocupações crescentes sobre um possível arranjo de armas em que Pyongyang fornece a Moscovo munições extremamente necessárias para seu uso na Ucrânia, em troca de assistência econômica e transferências de tecnologia que poderiam aumentar a ameaça representada pelo programa de armas nucleares e mísseis de Kim.
Rússia é o maior fornecedor de armamento ao Vietname
Ambos os países negam acusações de transferências de armas, o que violaria várias sanções do Conselho de Segurança da ONU que a Rússia endossou anteriormente.
No entanto, a Rússia é importante para o Vietname por duas razões, segundo Giang. É o maior fornecedor de equipamentos militares para a nação do Sudeste Asiático, e as tecnologias russas de exploração de petróleo ajudam a manter as reivindicações de soberania no contestado Mar do Sul da China.
"A Rússia quer sinalizar que não está isolada na Ásia, apesar da guerra da Ucrânia, e o Vietname está a reforçar um relacionamento tradicional fundamental, mesmo que também diversifique os laços com parceiros mais novos", refere Prashanth Parameswaran, um analista do Programa Ásia do Centro Wilson.
Hanói e Moscovo têm relações diplomáticas desde 1950 e este ano assinalam-se 30 anos do tratado que estabeleceu "relações amigáveis" entre o Vietname e a Rússia.
Num artigo escrito para Nhan Dan, o jornal oficial do Partido Comunista do Vietname, Putin prometeu aprofundar os laços entre Moscovo e Hanói e saudou o Vietname como um "forte defensor de uma ordem mundial justa, baseada no direito internacional, nos princípios de igualdade de todos os Estados e de não interferência nos assuntos internos."
O líder russo também agradeceu "aos amigos vietnamitas pela posição equilibrada sobre a crise ucraniana", no artigo divulgado pelo Kremlin.
Dado o isolamento internacional da Rússia, o Vietname está a fazer um "enorme favor" a Putin e "pode esperar favores em troca", escreveu Andrew Goledzinowski, embaixador australiano no Vietname, na rede social X.
Goledzinowski itiu que teria sido difícil para o Vietname recusar a visita, já que Putin já estava na Ásia e o Vietname tem laços históricos com a antiga União Soviética, mas sublinhou que é improvável que os dois fossem parceiros estratégicos novamente. "O Vietname sempre agirá nos interesses do Vietnam e não dos outros", escreveu ele.
A política pragmática do Vietname de "diplomacia de bambu" - uma frase cunhada por Trong referindo-se à flexibilidade da planta, que dobra mas não quebra com os ventos contrários da geopolítica global - está a ser mais testada do que nunca.
Até aqui, o Vietname permaneceu neutro quanto à invasão da Ucrânia pela Rússia. Mas a neutralidade está a ficar mais complicada de gerir, com a Embaixada dos EUA em Hanói criticando a visita de Putin.
A delegação diplomática norte-americana avisou que "nenhum país deve dar a Putin uma plataforma para promover a guerra de agressão que lhe permita normalizar as suas atrocidades." Se Putin puder viajar livremente, "poderá normalizar as flagrantes violações do direito internacional na Rússia", denuncia o comunicado da embaixada.
O Vietname precisa de apoio dos EUA para fazer avançar as ambições económicas e diversificar os laços de defesa, considera Parameswaran, acrescentando que o país "tem que calibrar cuidadosamente o que faz com a Rússia num ambiente de crescentes tensões entre Washington e Moscovo".
O comércio bilateral entre a Rússia e o Vietname ascendeu aos 3,6 mil milhões de euros em 2023, em comparação com 171 mil milhões com a China e 111 mil milhões com os EUA.
Desde o início dos anos 2000, a Rússia é responsável por cerca de 80% das importações de armas do Vietname. Esses números têm vindo a diminuir ao longo dos anos devido às tentativas vietnamitas de diversificar os seus parceiros. Mas fazer o total "desmame" da Rússia levará tempo, acredita Giang.