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Os russos n\u00e3o guardaram verdadeiramente muitas \u00e2ncoras no mundo e se Putin conseguiu habilmente transformar o seu poder de fazer mal em algo diferente no caso da quest\u00e3o das armas qu\u00edmicas, o facto \u00e9 que os russos n\u00e3o t\u00eam realmente alavancas, influ\u00eancia no mundo em geral, por isso est\u00e3o muito interessados na S\u00edria.euronews:O conflito s\u00edrio \u00e9 tamb\u00e9m a quest\u00e3o dos mais de dois milh\u00f5es de refugiados e dos pa\u00edses vizinhos que est\u00e3o \u00e0 beira da asfixia. Na Europa, a Alemanha acolheu 18 mil s\u00edrios desde o in\u00edcio do conflito, a Su\u00e9cia acolheu 11 mil, a Fran\u00e7a aceitou cerca de 600 pedidos de asilo no ano ado e 800 at\u00e9 agora, este ano. Isso n\u00e3o \u00e9 pouco para um pa\u00eds que proclama a sua solidariedade com o povo s\u00edrio?Hubert V\u00e9drine:Penso que em casos de trag\u00e9dias deste tipo, na medida do poss\u00edvel, se os refugiados puderem ser recebidos com boas condi\u00e7\u00f5es \u2013 o que n\u00e3o \u00e9 o caso \u2013 e n\u00e3o muito longe de casa, do pa\u00eds, n\u00e3o longe de onde t\u00eam fam\u00edlia, isso \u00e9 o ideal. 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Hubert V\u00e9drine:Em primeiro lugar, julgo que \u00e9 necess\u00e1rio distinguir muito claramente o que \u00e9 asilo do que \u00e9 imigra\u00e7\u00e3o. Asilo, \u00e9 o direito de asilo, isso corresponde a pessoas cuja vida est\u00e1 em perigo porque s\u00e3o perseguidas por 36 motivos. Aqui, temos uma base legal muito forte. \u00c9 uma quest\u00e3o de honra para a Europa, preservar o direito de asilo, e se o queremos preservar a longo prazo, n\u00e3o podemos mistur\u00e1-lo com a imigra\u00e7\u00e3o. A imigra\u00e7\u00e3o \u00e9 outra coisa. A imigra\u00e7\u00e3o \u00e9 obviamente o infort\u00fanio econ\u00f3mico e trata-se de regular fluxos. O que faz muita falta na Europa \u00e9 uma concerta\u00e7\u00e3o, ao menos nos pa\u00edses da zona Schengen, em que dir\u00edamos todos os anos \u2013 porque \u00e9 necess\u00e1rio adaptar \u00e0 conjuntura econ\u00f3mica: no pr\u00f3ximo ano, podemos receber em boas condi\u00e7\u00f5es \u2013 e para mais temos necessidade \u2013 um x n\u00famero de pessoas. Tamb\u00e9m podemos estabelecer quotas por profiss\u00e3o, mas nunca por na\u00e7\u00e3o, isso n\u00e3o faz nenhum sentido. Depois, podemos restringir em certos momentos, porque o desemprego est\u00e1 muito alto, ou alargar noutras alturas. Seria necess\u00e1rio uma esp\u00e9cie de term\u00f3stato para isso.euronews:Dado que o seu dom\u00ednio de especialidade \u00e9 a diplomacia, uma palavra sobre a diplomacia europeia. Tr\u00eas anos depois da cria\u00e7\u00e3o do Servi\u00e7o de A\u00e7\u00e3o Exterior da Uni\u00e3o Europeia, uma pol\u00edtica externa comum continua a ser uma ilus\u00e3o?Hubert V\u00e9drine:Sim. Acho que sim e para mais nunca acreditei ser poss\u00edvel. A ideia que vamos criar, do nada, uma diplomacia europeia \u00e9 completamente irreal, \u00e9 o exemplo t\u00edpico da quimera, da ilus\u00e3o que leva a desilus\u00f5es.euronews:Mas, mesmo assim, os servi\u00e7os de Catherine Ashton s\u00e3o bastante ativos e conduzem mesmo alguns dossiers: o Kosovo, as rela\u00e7\u00f5es com os vizinhos a Leste, o nuclear iraniano\u2026Hubert V\u00e9drine:Claro, d\u00e3o o seu melhor, mas isso n\u00e3o tem grande peso por compara\u00e7\u00e3o. Se perguntar aos dirigentes chineses ou a Obama, isso n\u00e3o conta. Isto n\u00e3o \u00e9 uma cr\u00edtica, n\u00e3o tem solu\u00e7\u00e3o. A Uni\u00e3o Europeia nunca teve uma posi\u00e7\u00e3o.euronews:Portanto, pensa que nunca existir\u00e1 um poder diplom\u00e1tico europeu?Hubert V\u00e9drine:Ele existir\u00e1 no final de um longo processo. Julgo que Jacques Delors falava da necessidade de uma longa matura\u00e7\u00e3o. \u00c9 preciso organizar a matura\u00e7\u00e3o. \u00c9 necess\u00e1rio ter a coragem de itir que temos posi\u00e7\u00f5es diferentes, o que \u00e9 totalmente leg\u00edtimo, \u00e9 a hist\u00f3ria, \u00e9 assim. Penso tamb\u00e9m que os pa\u00edses com maiores diverg\u00eancias, n\u00e3o obrigatoriamente os maiores pa\u00edses \u2013 podem ser grandes, m\u00e9dios ou pequenos \u2013 esses pa\u00edses com enormes diverg\u00eancias sobre um tema deviam ter a obriga\u00e7\u00e3o de, em conjunto, encontrar um meio-termo para avan\u00e7ar.euronews:N\u00e3o podemos deixar de falar do pr\u00f3ximo grande teste para a Europa: as elei\u00e7\u00f5es europeias dentro de sete meses. Se, como as sondagens e os observadores prev\u00eaem, as for\u00e7as anti Uni\u00e3o Europeia ganharem muito terreno, que li\u00e7\u00e3o ser\u00e1 necess\u00e1rio tirar?Hubert V\u00e9drine:Talvez eles venham a ser muito fortes no Paramento Europeu. \u00c9, de facto, bastante lament\u00e1vel, mas ao mesmo tempo \u00e9 uma esp\u00e9cie de erup\u00e7\u00e3o de borbulhas, \u00e9 uma esp\u00e9cie de fen\u00f3meno da crise.euronews:N\u00e3o mais do que isso?Hubert V\u00e9drine:O que \u00e9 que isso muda? Temos de contrariar isso com decis\u00f5es concretas nas quais o sistema europeu funciona em rela\u00e7\u00e3o a temas aos quais as pessoas s\u00e3o sens\u00edveis. A\u00ed, as pessoas v\u00e3o dizer: a m\u00e1quina europeia tem resposta para uma dada quest\u00e3o. Se n\u00e3o, temos de nos preparar para este choque, lev\u00e1-lo a s\u00e9rio, mas sem fazer disso um drama. De qualquer forma, recordemo-nos que na Alemanha, o tribunal de Karlsruhe considera que o Parlamento Europeu n\u00e3o \u00e9 suficientemente democr\u00e1tico e portanto n\u00e3o \u00e9 suficientemente leg\u00edtimo. Acho que uma boa resposta para os pr\u00f3ximos anos \u00e9 restabelecer liga\u00e7\u00f5es com os parlamentos nacionais. Isso \u00e9 perfeitamente poss\u00edvel. O Tratado de Lisboa tem cl\u00e1usulas que prev\u00eaem que associemos mais os parlamentos nacionais. No plano pol\u00edtico, de legitimidade pol\u00edtica, de como contrariar opini\u00f5es p\u00fablicas euroc\u00e9ticas mas n\u00e3o hostis \u00e0 mec\u00e2nica europeia, julgo que isso se pode fazer atrav\u00e9s dos parlamentos nacionais. euronews:Se pudesse, o que \u00e9 que mudaria no que chamamos de Europa institucional?Hubert V\u00e9drine:Mudaria o que acabei de dizer, ou seja, restabelecia liga\u00e7\u00f5es com os parlamentos nacionais. 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"A ideia que vamos criar, do nada, uma diplomacia europeia é completamente irreal", Hubert Védrine, ex-MNE francês

"A ideia que vamos criar, do nada, uma diplomacia europeia é completamente irreal", Hubert Védrine, ex-MNE francês
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Foi chefe da diplomacia sa entre 1997 e 2002. Socialista, diplomata experiente, Hubert Védrine andou pelas altas esferas do Estado durante cerca de duas décadas. Fomos ao seu encontro durante as “Jornadas de Bruxelas”, três dias de debates consagrados à Europa. Sem rodeios, respondeu às nossas questões sobre o confito na Síria e a Europa dos nossos dias.

Audrey Tilve, euronews:
Vamos falar da Europa, mas primeiro gostava de saber como olha para o conflito na Síria. O desmantelamento do arsenal de armas químicas já começou mas ainda não há uma solução política em vista para a crise. Fala-se numa possível conferência de paz a meio de novembro. Acredita que irá acontecer?

Hubert Védrine, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros (MNE) francês:
Será que isso poderá funcionar? Não sei. É muito complicado. De qualquer forma, os ocidentais não irão conseguir a saída antecipada de Assad. Isso falhou. Portanto, será uma conferência que parte com ele no poder mas em que se procurará pensar no que virá a seguir, que um dia existirá uma transição. Seja de que perspetiva for, é melhor que se realize esta conferência “Genebra 2” do que ela não aconteça. Depois, temos a questão da representação da oposição e dos rebeldes, que é uma questão complicada porque trata-se de muita gente e que não está na mesma linha. Mas se os russos e os americanos conseguirem estar de acordo – visto que o arranjo para a neutralização das armas químicas relançou uma espécie de relação tensa, mas mesmo assim de trabalho – eles conseguirão também encontrar uma solução para esse ponto.

euronews:
Quando Bashar Al-Assad recusa negociar com os rebeldes enquanto eles não depem as armas, isso é ponto assente ou uma forma de começar a negociar?

Hubert Védrine:
É uma pechincha, mas de qualquer forma é muito mais importante o ponto de vista russo que o de Assad e não se pode excluir que, um dia, os russos acabem por considerar Assad incómodo por causa disso, porque não estão ligados à pessoa, estão sim preocupados na forma como se posicionam nesta região. Os russos não guardaram verdadeiramente muitas âncoras no mundo e se Putin conseguiu habilmente transformar o seu poder de fazer mal em algo diferente no caso da questão das armas químicas, o facto é que os russos não têm realmente alavancas, influência no mundo em geral, por isso estão muito interessados na Síria.

euronews:
O conflito sírio é também a questão dos mais de dois milhões de refugiados e dos países vizinhos que estão à beira da asfixia. Na Europa, a Alemanha acolheu 18 mil sírios desde o início do conflito, a Suécia acolheu 11 mil, a França aceitou cerca de 600 pedidos de asilo no ano ado e 800 até agora, este ano. Isso não é pouco para um país que proclama a sua solidariedade com o povo sírio?

Hubert Védrine:
Penso que em casos de tragédias deste tipo, na medida do possível, se os refugiados puderem ser recebidos com boas condições – o que não é o caso – e não muito longe de casa, do país, não longe de onde têm família, isso é o ideal. Por isso, parece-me que a prioridade dos europeus – se conseguirem chegar a acordo sobre isso – deveria ser de ajudar muitíssimo mais a Turquia, a Jordânia, etc… Penso que há margem para que a França acolha mais gente mas não quero fazer demagogia moralista com isso. É demasiado complicado e, de qualquer forma, necessitaríamos de uma política migratória mais bem coordenada.

euronews:
Olhemos então para a política europeia de asilo e imigração na Europa, as consequências do drama de Lampedusa, mais de 300 mortos, migrantes que tentavam chegar à Europa. Na sequência disso, os governos europeus comprometeram-se a fazer mais pela segurança e pelas operações de socorro no Mediterrâneo, mas há ainda uma maioria que recusa a ideia de repartir os migrantes pela Europa para aliviar os países de chegada. O que é preciso para conseguir isso?

Hubert Védrine:
Em primeiro lugar, julgo que é necessário distinguir muito claramente o que é asilo do que é imigração. Asilo, é o direito de asilo, isso corresponde a pessoas cuja vida está em perigo porque são perseguidas por 36 motivos. Aqui, temos uma base legal muito forte. É uma questão de honra para a Europa, preservar o direito de asilo, e se o queremos preservar a longo prazo, não podemos misturá-lo com a imigração. A imigração é outra coisa. A imigração é obviamente o infortúnio económico e trata-se de regular fluxos. O que faz muita falta na Europa é uma concertação, ao menos nos países da zona Schengen, em que diríamos todos os anos – porque é necessário adaptar à conjuntura económica: no próximo ano, podemos receber em boas condições – e para mais temos necessidade – um x número de pessoas. Também podemos estabelecer quotas por profissão, mas nunca por nação, isso não faz nenhum sentido. Depois, podemos restringir em certos momentos, porque o desemprego está muito alto, ou alargar noutras alturas. Seria necessário uma espécie de termóstato para isso.

euronews:
Dado que o seu domínio de especialidade é a diplomacia, uma palavra sobre a diplomacia europeia. Três anos depois da criação do Serviço de Ação Exterior da União Europeia, uma política externa comum continua a ser uma ilusão?

Hubert Védrine:
Sim. Acho que sim e para mais nunca acreditei ser possível. A ideia que vamos criar, do nada, uma diplomacia europeia é completamente irreal, é o exemplo típico da quimera, da ilusão que leva a desilusões.

euronews:
Mas, mesmo assim, os serviços de Catherine Ashton são bastante ativos e conduzem mesmo alguns dossiers: o Kosovo, as relações com os vizinhos a Leste, o nuclear iraniano…

Hubert Védrine:
Claro, dão o seu melhor, mas isso não tem grande peso por comparação. Se perguntar aos dirigentes chineses ou a Obama, isso não conta. Isto não é uma crítica, não tem solução. A União Europeia nunca teve uma posição.

euronews:
Portanto, pensa que nunca existirá um poder diplomático europeu?

Hubert Védrine:
Ele existirá no final de um longo processo. Julgo que Jacques Delors falava da necessidade de uma longa maturação. É preciso organizar a maturação. É necessário ter a coragem de itir que temos posições diferentes, o que é totalmente legítimo, é a história, é assim. Penso também que os países com maiores divergências, não obrigatoriamente os maiores países – podem ser grandes, médios ou pequenos – esses países com enormes divergências sobre um tema deviam ter a obrigação de, em conjunto, encontrar um meio-termo para avançar.

euronews:
Não podemos deixar de falar do próximo grande teste para a Europa: as eleições europeias dentro de sete meses. Se, como as sondagens e os observadores prevêem, as forças anti União Europeia ganharem muito terreno, que lição será necessário tirar?

Hubert Védrine:
Talvez eles venham a ser muito fortes no Paramento Europeu. É, de facto, bastante lamentável, mas ao mesmo tempo é uma espécie de erupção de borbulhas, é uma espécie de fenómeno da crise.

euronews:
Não mais do que isso?

Hubert Védrine:
O que é que isso muda? Temos de contrariar isso com decisões concretas nas quais o sistema europeu funciona em relação a temas aos quais as pessoas são sensíveis. Aí, as pessoas vão dizer: a máquina europeia tem resposta para uma dada questão. Se não, temos de nos preparar para este choque, levá-lo a sério, mas sem fazer disso um drama. De qualquer forma, recordemo-nos que na Alemanha, o tribunal de Karlsruhe considera que o Parlamento Europeu não é suficientemente democrático e portanto não é suficientemente legítimo. Acho que uma boa resposta para os próximos anos é restabelecer ligações com os parlamentos nacionais. Isso é perfeitamente possível. O Tratado de Lisboa tem cláusulas que prevêem que associemos mais os parlamentos nacionais. No plano político, de legitimidade política, de como contrariar opiniões públicas eurocéticas mas não hostis à mecânica europeia, julgo que isso se pode fazer através dos parlamentos nacionais.

euronews:
Se pudesse, o que é que mudaria no que chamamos de Europa institucional?

Hubert Védrine:
Mudaria o que acabei de dizer, ou seja, restabelecia ligações com os parlamentos nacionais. Não creio que seja necessário fazer da Comissão uma espécie de governo da Europa. Para mais, isso nunca vai acontecer. Portanto, que interesse tem dizer isso, para termos uma deceção? Por outro lado, a Comissão tem de reencontrar o seu papel de impulsionadora, de inovação que já teve na época de Delors, que foi uma grande era. Mas isso é uma questão de comportamento, não é uma questão de mudança de instituições. Genericamente, não sou de todo a favor de um novo tratado. Penso que lançarmo-nos agora na elaboração de um novo tratado é procurar quezílias intermináveis entre os países participantes e uma ratificação completamente aleatória, mesmo ao nível dos parlamentos, e absolutamente imprevisível onde houver um referendo. Portanto, é uma ideia muito má. Paremos de fazer novos tratados a cada 3-4 anos. É uma questão de vontade política.

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